Condições do Congresso são as mesmas para Lula (por Leonardo Barreto)

Antes, durante e depois das eleições para as presidências da Câmara e do Senado, jornalistas faziam quase sempre a mesma pergunta aos analistas: “a relação do presidente Lula melhorará com Hugo Motta e Davi Alcolumbre”?

Dentro daquilo que seu figurino pede, o senador Randolfe Rodrigues, em entrevista ao jornal Valor Econômico, afirmou que 80% dos problemas do Planalto com o Congresso Nacional estariam resolvidos. Mas todo mundo sabe que não é bem assim.

A votação expressiva – praticamente sem concorrentes – e os discursos de posse sugerem que a prioridade dos novos presidentes é consolidar as prerrogativas dos parlamentares. Traduzindo, Motta e Alcolumbre não são movidos por nenhuma força ideológica em especial. Antes, são os líderes do sindicato de deputados e senadores.

Essa representação corporativa pode até desaguar em algo maior e sistêmico. Hugo Motta, em discurso que pode ser o mais parlamentarista da história da Câmara, afirmou que o “governo” é formado pelo Executivo e pelo Legislativo. Às vezes, coisas grandes são obtidas a partir da soma de interesses pequenos.

Nesse sentido, antes de considerar a receptividade da pauta do governo, é preciso estar atento para a própria agenda do Legislativo e ela envolve a consolidação de um novo modelo de governança que depende de uma agenda externa e outra interna.

Para fora, STF, Congresso e Planalto precisam acertar a divisão e a execução do Orçamento. Para dentro, é necessário pacificar a relação entre Câmara e Senado, muito conflituosa sob a administração de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco.

Soma-se a isso um desafio especial dos deputados: reinstitucionalizar o rito decisório da Casa. Desde a pandemia, se estabeleceu uma oligarquia em torno de Arthur Lira que teve, até aqui, um domínio da agenda. O controle total fragilizou as instâncias formais da Câmara, como as comissões, os critérios de distribuição de relatorias, os prazos e os requisitos para a aprovação de projetos, gerando reclamações em que não pertence ao “clube”.

Não foram poucas as vezes nas quais uma proposta de interesse dessa elite recebia parecer no mesmo dia da votação em plenário. Nessas situações, assessores brincavam que o projeto havia obedecido o RIL (Regimento Interno do Lira). A insatisfação com esse modus operandis apareceu no discurso de Motta. Ele prometeu reestabelecer as regras tradicionais. A ver.

De todo modo, o relacionamento de Lula com as novas lideranças do Congresso, a situação deve continuar mais ou menos o mesmo porque as condições objetivas do balanço de poder não mudaram.

A chance de algo novo acontecer depende de o Planalto fazer novas rodadas de concessão de espaços no governo, aceitar a divisão atual do orçamento, ajudar a pacificar o embate com o STF e dividir a pauta de formulação de políticas públicas com Câmara e Senado. Em outras palavras, aceitar de uma vez por todas entrar na dança parlamentarista proposta pelo Congresso.

 

Leonardo Barreto é doutor em Ciência Política e sócio da consultoria Think Policy. 

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