TCDF terá IA e gestão “estupidamente econômica”, diz novo presidente

Recém-empossado presidente do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), Manoel de Andrade anunciou, em entrevista à coluna Grande Angular, a implementação da inteligência artificial e a adoção de linguagem simples.

Andrade também negou aposentadoria antes do prazo compulsório, falou sobre gratificação retroativa e prometeu uma gestão “estupidamente austera e econômica”.

Com 25 anos de atuação no TCDF, Andrade reassume o comando da Corte de Contas após 18 anos, sendo atualmente o mais antigo entre os pares. Uma das prioridades da gestão, segundo o presidente, será a modernização do TCDF, com implementação da inteligência artificial (IA) para agilizar auditorias.

Andrade disse que trabalha no desenvolvimento de estratégias alinhadas à nova realidade tecnológica. “A inteligência artificial vai ser implantada no Tribunal de Contas e com a maior rapidez possível”, afirmou, ressaltando que pretende garantir a proteção dos dados dos processos.

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Entrevista com o presidente do TCDF, Manoel de Andrade

O presidente Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), Manoel de Andrade, concedeu entrevista à coluna Grande Angular
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Manoel de Andrade assumiu a presidência do TCDF para os próximos dois anos

KEBEC NOGUEIRA/METRÓPOLES

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Entrevista com o presidente do TCDF, Manoel de Andrade

Pollyana Resende/TCDF

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O presidente Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), Manoel de Andrade, concedeu entrevista à coluna Grande Angular

KEBEC NOGUEIRA/METRÓPOLES

Andrade defendeu a simplificação da linguagem técnica utilizada pelo tribunal, para torná-la mais acessível à população. Segundo o presidente da Corte de Contas, termos excessivamente técnicos e rebuscados dificultam o entendimento e devem ser evitados.

“Você deve tirar aquelas palavras rebuscadas, aquele linguajar difícil, técnico, para dizer com as mesmas palavras algo que a população entenda. Essa é a nossa visão para facilitar a comunicação e a compreensão do papel do Tribunal de Contas”, declarou Andrade.

A nova gestão também pretende intensificar a atuação pedagógica do TCDF junto aos gestores públicos. Para Andrade, o tribunal deve desempenhar um papel orientador, auxiliando o governo local na condução de políticas públicas mais eficazes.

“O Tribunal tem que entrar como um órgão orientador, pedagógico, para facilitar a compreensão. Nós temos obrigação de valorizar o intercâmbio e a conversa que orienta o administrado em como ele preparar as suas contas”, afirmou. Um dos projetos nesse sentido é o Visitas aos Gestores do GDF, iniciativa lançada no mês passado para fortalecer o diálogo entre os órgãos e disseminar boas práticas de governança, segundo o TCDF.

Sobre sua permanência no tribunal, o decano afirmou que pretende continuar trabalhando até a aposentadoria compulsória, hoje fixada em 75 anos. Andrade tem 71 anos.

“É natural querer minha vaga, né? Agora, basta saber se eu vou entregar fácil essa vaga. Eu tenho mais quase quatro anos pra ficar no tribunal. É possível que venham mais cinco anos. Se acontecer, os que esperam hoje, vão ter que esperar mais nove anos”, disse, em referência à proposta de ampliação da idade de aposentadoria compulsória para 80 anos.

Assista a entrevista completa:

Leia a entrevista com o presidente do TCDF, Manoel de Andrade:

Jornalista: Presidente, o senhor reassume agora a chefia do Tribunal de Contas do Distrito Federal, depois de 18 anos. O que mudou nesse período?

Manoel de Andrade: Não é a chefia. Eu sou o síndico do Tribunal de Contas, para cuidar da administração dos próprios no tribunal, gerenciar a folha de pagamento e administrar. É um colegiado e o presidente existe para cumprir algumas metas que a administração impõe. O tribunal mudou muito. 18 anos atrás, nós tínhamos uma outra feição do tribunal. Nós estávamos começando com a internet tomando conta, os processos eletrônicos começando… Até então eram todos processos físicos. As auditorias eram mais demoradas, nós não tínhamos uma boa entrada nos algoritmos. E agora nós temos. E agora já começamos com a inteligência artificial. Isso é novidade que vai ajudar muito na consecução dos objetivos do Tribunal de Contas.

Jornalista: Quais serão as prioridades da sua gestão?

Manoel de Andrade: A primeira coisa que eu tenho colocado é uma boa conversa com os gestores da cidade. Nós queremos interagir com eles, de forma pedagógica, conversar antes, quer dizer, de forma antecipada, para evitarmos muitos conflitos. Basicamente, no tocante à preparação de editais, contratos, prestação de contas, evitar uma série de problemas com a conversa. Queremos um tribunal pedagógico, um tribunal orientador.

Jornalista: O senhor está falando sobre essa ação preventiva para evitar que haja mau uso dos recursos públicos ou mesmo erro do gestor por falta de informação para que o Tribunal de Contas possa fazer esse auxílio na hora de elaborar os editais e as licitações. Mas o Tribunal também tem um papel importante, que é o papel de avaliação posterior, até repressivo. Nesse sentido, o que o Tribunal de Contas deve fazer? Haverá uma ação mais repressiva também?

Manoel de Andrade: A última coisa que o Tribunal deveria fazer é reprimir o gestor, porque a crença é de que todo gestor age de boa vontade, de boa fé. Muitas vezes, ele não implementa a política dentro da liturgia da lei é porque, às vezes, ele nem sabe. É por isso que o Tribunal tem que entrar como um órgão também orientador, pedagógico, para facilitar a compreensão. Nesse sentido, nós temos obrigação de valorizar o intercâmbio, a conversa, essa conversa preventiva que orienta o administrado como ele deve preparar as suas contas. Imagina uma Tomada de Contas Especial, que já é um começo de um processo repressivo, o tribunal está ali verificando se aquela conduta é uma conduta dolosa ou apenas uma culpa por falta de conhecimento.

E, no final, na apreciação dessas contas, também no julgamento, tudo isso é levado em conta. Quando não sobrar mais nada, naturalmente, o tribunal tem que aplicar a pena que o caso requer. Mas isso, eu digo: não é nossa pretensão. O momento é de não deixar acontecer. Por isso, nas minhas gestões anteriores, eu levei o tribunal para fora do seu prédio, visitei todos jurisdicionados, faculdades e as administrações regionais para justamente, com eles, contemporizar um diálogo de compreensão, onde não existisse ali um superior ao outro, apenas os dois querendo construir um resultado promissor para a sociedade.

Jornalista: Presidente, historicamente, os tribunais, tanto do Poder Judiciário quanto os Tribunais de Contas, criaram uma imagem de certo distanciamento da população em geral, muito em razão da linguagem característica desses órgãos. Essa hoje é uma preocupação do Tribunal de Contas, no sentido de ter um tribunal mais próximo das pessoas?

Manoel de Andrade: Desde que entrei no Tribunal, a primeira coisa que eu fiz foi abrir o gabinete. Quem quiser conversar comigo e quem quiser consultar, quiser interagir, quiser conhecer, o tribunal vai estar à disposição. Outra coisa importante, dentro dessa linha de atuação, é que Tribunal precisa se comunicar com a sociedade. Eu não posso pegar uma toga e achar que eu sou Deus. Eu tenho que interagir com ele. Eu vou errar também. O tribunal também erra. É bom deixar claro, Isadora. Se deixar, alguém recorre do Supremo, que também erra. Se for ao Tribunal de Haia, também erra. E o Nuremberg também. Todos erram. O infinito seria Deus. Como ninguém consegue fazer o julgamento com Deus, a gente fica por aqui, pela Terra, mas com uma cautela de que nós somos obrigados a reavaliar as nossas próprias políticas, com o Tribunal sendo também fiscalizado dentro de uma visão de controle social. O cidadão também pode dizer: ‘Olha, Tribunal, você errou’. E a gente tem que ter capacidade de fazer uma reavaliação da própria ação do tribunal. O Judiciário, também, há dificuldade de você interagir com um juiz. É muito difícil no Brasil, muito difícil. Nos Estados Unidos, o juiz é eleito, o promotor é eleito, o xerife é eleito pra ele conversar com o povo. Ele só retorna ao mandato se ele conseguir sagrar-se nas urnas com apoio da maioria do povo, aquele no Condado ou no Estado onde ele for candidato. E aqui no Brasil, já que não tem isso, mas eu entendo que é preciso que os conselheiros, os juízes e todos mais tenham uma aproximação maior com a sociedade para sentir o pulsar da sociedade.

Jornalista: Em relação à linguagem simples, como o senhor citou, o que o Tribunal vai fazer nesse sentido?

Manoel de Andrade: Nós vamos, agora, nos embrenhar com o compromisso de facilitar a compreensão. Até eu conversava com a nossa chefe da comunicação, a Pollyana, para gente preparar um arcabouço de informações, mostrando a linguagem de compreensão para o gestor e também para o cidadão, dentro uma visão do povo comum. Você tirar aquelas palavras rebuscadas, aquele linguajar difícil, técnico, para dizer, com as mesmas palavras, algo que a população entenda. Essa é a nossa visão para facilitar a comunicação e a compreensão do papel do Tribunal de Contas.

Jornalista: O mundo passa por uma transformação tecnológica que, inclusive, avança de uma forma muito rápida. Os órgãos públicos já têm desenvolvido algumas estratégias para se adaptar a essa nova realidade. O Tribunal de Contas do Distrito Federal vai implementar, por exemplo, o uso de inteligência artificial. Existe projetos para isso?

Manoel de Andrade: Com certeza. É uma das coisas que eu estou me preocupando já. Estamos preparando um grupo de trabalho justamente para ajustar a compreensão, levando em consideração a segurança dos dados, que não podem vazar. Então, nós estamos buscando forma de dar segurança. Não tem como ter um passo atrás. A inteligência artificial vai ser implantada também no Tribunal de Contas e com a maior rapidez possível.

Jornalista: Como a inteligência artificial pode ajudar no dia a dia?

Manoel de Andrade: Imagine você com o volume de processos para fazer mitigação, você cotejar informações de um processo para outro. A inteligência artificial vai trazer tudo isso. Ela vai dar para o analista, o auditor, informações que ele precisa, ele vai dar a burilada que achar importante para justamente adequar aquelas informações. Na verdade, ela já vem quase por completo.

Jornalista: O tribunal tem alguma ação específica também para o combate à dengue e para outros casos da saúde pública, que é a grande reclamação da população?

Manoel de Andrade: O Tribunal tem andado preocupado, porque, no ano passado, o Metrópoles deu muito isso. Nós chegamos a mais de 300 mil casos estimados, e, neste ano, a preocupação também de ampliação ou manutenção desse número excessivo de doentes provocados pela dengue. Mas eu, pessoalmente, tenho uma preocupação grande. Eu vejo ao sair na rua para ver onde tinha problema. Os lixos acumulados, que justamente são focos terríveis de proliferação de mosquito. E nós cobramos do governo solução imediata. E, realmente, foi prontamente atendido. Mas nós queremos mais do que isso: evitar ao máximo a proliferação de mosquito. É a única forma de você conviver com a cidade com baixíssimo índice de dengue, que é possível. A questão sanitária, se for levada a sério para valer, nós vamos reduzir de forma considerável a dengue. No tocante à saúde, de modo geral, nós estamos sofrendo. Brasília é uma das unidades federadas com a baixa qualidade no atendimento médico e isso envolve a questão estrutural, não é mais conjuntural. A estrutura da saúde envolve recursos humanos e talvez seja uma busca da motivação dos agentes que trabalham na saúde para que eles façam o que for possível para melhorar e dar vazão ao número excessivo dessa demanda reprimida.

Jornalista: Presidente, o senhor completa agora 25 anos de Tribunal de Contas. Nos bastidores políticos, falam da sua aposentadoria para abertura da vaga de conselheiro. O que o senhor tem a dizer sobre isso?

Manoel de Andrade: É natural querer minha vaga, né? Agora basta saber se eu vou entregar fácil essa vaga. Eu tenho mais quase quatro anos para ficar no tribunal. É possível que venha mais cinco anos. Há um projeto em andamento, há uma tendência toda para elevar a idade [da aposentadoria compulsória] para 80 anos. Se acontecer, os que esperam hoje, vão ter que esperar mais quase nove anos. Eu espero que isso aconteça, porque eu não estou com a menor vontade de deixar o Tribunal de Contas.

Jornalista: O Tribunal de Contas aprovou uma gratificação retroativa para os conselheiros e procuradores do Ministério Público de Contas, que gerou o pagamento, de uma só vez, de R$ 5,8 milhões. Por que o Tribunal de Contas aprovou essa gratificação retroativa, de forma rápida no final do ano?

Manoel de Andrade: É uma pergunta, Isadora, interessante. Eu acho que a população tem que perguntar mesmo. E, se alguém quer criticar, deve, porque eu acho que faz parte do processo democrático. Quem fiscaliza deve, também, ser fiscalizado. Eu disse aqui pra ti antes: o fiscalizador também tem que ser fiscalizado. Quando a população levanta a questão, é natural, isso é democrático, é legítimo. A questão foi que o pagamento no final do ano, de uma vez só, gerou especulações. Só que esse pagamento vinha correndo a nível nacional e retroativo. O CNJ decidiu, lá atrás, que essas dívidas são retroativas a 2015. O tribunal se reportou a pagar até 2018. O grande problema foi o pagamento quase, digamos, inopinado. Isso não foi na minha gestão. Mas eu também estava presente, não vou negar, estava presente. Talvez não tivesse feito desse jeito, mas foi feito. Foi feito e a população reclamou, ocorreram ações populares que não obtiveram êxito até agora e, na minha visão, não vão obter êxito por esse campo, porque é legal. O pagamento está sendo legal, tanto que a própria juíza que, num primeiro momento ela quase concedeu a liminar, agora recuou para esperar até o fim do julgamento de mérito. Por que? Porque esse pagamento é feito de forma uniforme no Brasil inteiro. Os conselheiros têm o vencimento totalmente igual aos desembargadores, que são regidos pela Loman [Lei Orgânica da Magistratura Nacional]. A norma é uma só em que toca a remuneração. Então isso vai ser resolvido no final, no julgamento de mérito dessa ação.

Jornalista: Presidente, no final do ano passado, 2024, o plenário também aprovou uma mudança na nomenclatura dos membros da Corte de Contas local. Antes se chamavam conselheiros e, agora, são desembargadores de conta. Qual é a opinião do senhor sobre esse tema já que no país isso é inédito?

Manoel de Andrade: Eu sou conselheiro, Isadora. E quem quiser usar… Eu sou conselheiro. Há uma igualdade, uma isonomia. A Loman fala que o conselheiro tem as mesmas prerrogativas e impedimentos do desembargador. Desembargador de contas ou conselheiro… Eu gosto mais da expressão conselheiro.

Jornalista: O que se pode esperar da nova gestão Manoel de Andrade como presidente do Tribunal de Contas?

Manoel de Andrade: Trabalho, trabalho, trabalho, austeridade, economicidade dentro do princípio da administração da racionalidade. Eu pretendo imprimir uma gestão estupidamente austera, estupidamente econômica, eficiente (é pretensão minha, eu vou tentar fazer isso), e efetiva e que o tribunal possa se projetar como um tribunal verdadeiramente cidadão, e que ajude o governo levar as políticas. Eu sempre digo, Isadora: é importante que o governo leve as políticas na sua concretude. Ela saia com 100 e chegue com 100, que não perca a qualidade na caminhada. Quer dizer, a máquina tem que fazer chegar às comunidades mais carentes a ação do governo completa. Dentro dessa, essa visão social, visão econômica, visão racional.

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