Batalha cultural põe gestão Nunes sob pressão da direita e da esquerda

São Paulo — Sob o comando de Totó Parente (MDB), ex-vereador de Cuiabá (MT) que já exerceu cargos nos governos petistas de Dilma Rousseff e Lula, a Secretaria Municipal da Cultura começou o ano pressionada por movimentos de direita e de esquerda que cobram mudanças na área e criticam ações do mandato anterior do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

As reivindicações variam de acordo com o grupo. Artistas que apoiaram o prefeito na campanha pela reeleição falam que a pasta foi “aparelhada” nos últimos anos pelo que chamam de “cultura woke” – expressão usada para identificar pautas identitárias, ligadas à defesa das minorias.

O grupo é liderado pelos cineastas Newton Cannito e Josias Teófilo, criadores do movimento “Artistas Livres”, que reúne cerca de vinte nomes do setor cultural paulista. Entre outros temas, eles reivindicam trocas na diretoria da SPCine e a revisão de editais, que dizem ter um “excesso de cotas” atualmente.

“Estão impondo critérios que excluem pessoas dos editais públicos. Nós estamos pedindo apenas que seja de livre concorrência, como sempre foi na democracia”, afirma Newton, que não se considera de direita, mas que “não tem preconceito com a direita”.

“Quando você aparelha a cultura, ainda mais numa ideologia como a woke, que não dialoga com o povo brasileiro, você afasta a produção cultural do povo. O Theatro de São Paulo está afastado do público como nunca antes. Aí falam que ‘é a internet’. Não é verdade. Nova York, Buenos Aires, todas as capitais continuam com teatro que tem muito público. O Theatro de São Paulo, por estar completamente aparelhado por essa ideologia, espantou o público”, completou.

Se a agenda “anti-woke” se impõe de um lado, do outro, movimentos culturais progressistas também cobram mudanças na secretaria comandada por Totó Parente (à direita na foto em destaque).

Eles criticam a falta de participação popular na gestão nas Casas de Cultura — ameaçadas de privatização no primeiro mandato de Nunes —, e denunciam atrasos na publicação de editais e no pagamento a produtores culturais, que teriam acontecido nos últimos anos do governo anterior do emedebista.

“Eu fiz um show em outubro e fui receber no começo do ano seguinte. E isso é crônico a ponto de ter existido uma mobilização dos artistas reivindicando que os pagamentos fossem feitos”, diz Olívia de Lucas, uma das participantes da articulação dos Movimento Culturais da Cidade de São Paulo (MCCSP).

O movimento também cobra que a cidade tenha o que chamam de “CPF da Cultura”. A sigla, para Conselho, Plano e Fundo, faz referência à criação de um sistema de políticas públicas para o setor, com um plano de ações para a área, um conselho com participação popular, e um fundo para financiar investimentos na cultura.

Os dois grupos, Artistas Livres e MCCSP, se reuniram recentemente com representantes da gestão Nunes na Cultura para levar suas reivindicações. No caso do movimento “anti-woke”, a conversa foi direta com o secretário Totó Parente e abordou, entre outros temas, as críticas do setor ao modelo atual da Virada Cultural, também questionado pelo MCCSP.

“Estamos em diálogo com o secretário. As ideias que a gente colocou para a Virada Cultural ele se mostrou muito aberto. Ou tem coisa que ele aceitou, ou tem coisa que eu já estava pensando parecida”, disse Newton.

Depois da reunião, Totó anunciou que quer voltar a concentrar a programação da Virada Cultural no centro, como acontecia quando o projeto foi criado, levando outras linguagens artísticas para as periferias.

De fora de São Paulo, o secretário tem buscado o diálogo com o setor enquanto se inteira sobre a rotina da secretaria, que tem um orçamento de mais de R$ 848 milhões.

Bancada “anti-woke” na Câmara

Enquanto isso, a pressão sobre a área cultural tem ganhado repercussão na Câmara Municipal de São Paulo. A vereadora Janaína Paschoal (PP) protocolou recentemente um Projeto de Resolução que pede a criação de uma Frente Parlamentar em defesa do “Movimento dos Artistas Livres”.

Além de Janaína, o grupo seria formado pelos vereadores Adrilles Jorge (União), Amanda Vettorazzo (União), Cris Monteiro (Novo), João Jorge (MDB), Lucas Pavanato (PL), Rubinho Nunes (União), Rute Costa (PL) e Sonaira Fernandes (PL).

Entre as atribuições da frente parlamentar, estariam “promover a diversidade cultural, buscando a ampliação de políticas públicas, sem que
ideologias ou pautas restritivas se sobreponham às variadas vozes criativas”.

Outro objetivo, segundo o documento protocolado na Câmara, é “acompanhar a publicação dos editais culturais” e permitir a “participação de diferentes grupos sem a imposição de critérios ideológicos ou políticas restritivas que limitem a liberdade criativa”.

Os vereadores “anti-woke” estiveram presentes na reunião entre o grupo Artistas Livres e o secretário Totó Parente na última segunda-feira (3/2), quando pediram mais “pluralidade” na cultura.

Segundo parlamentares ouvidos pelo Metrópoles, Parente ouviu as demandas e se comprometeu a dar atenção a elas. “Ele sinalizou que sabe que tem que ter atenção com a pauta anti-woke”, afirmou Amanda Vettorazzo.

Adrilles Jorge, no entanto, considera que Parente não se comprometeu o suficiente com as pautas “conservadoras”. ”Ele não foi muito claro na questão de enfrentar o identitarismo que domina todas as produções culturais fomentadas pelo Estado. Deixou uma promessa vaga e disse que está começando agora”, afirmou o vereador.

Em um aceno à parte mais conservadora da base aliada de Nunes, Totó Parente se comprometeu a colocar atrações de música gospel e cristã na Virada Cultural, que ocorre em maio.

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