Delator do PCC: policial civil preso extorquia de puteiro a desmanche

São Paulo — Quando policiais federais cumpriram um mandado de busca e apreensão na casa do investigador da Polícia Civil Marcelo Marques de Souza, o Bombom, em 17 de dezembro, foram encontrados R$ 200 mil, em dinheiro vivo, além de planilhas nas quais havia valores recolhidos de comércios — parte deles ilegais.

Bombom é um dos 26 alvos presos, até o momento, suspeitos de envolvimento no assassinato do delator do Primeiro Comando da Capital (PCC) Vinícius Gritzbach — executado com dez tiros de fuzil no Aeroporto Internacional de São Paulo, na região metropolitana.

Conhecida entre policiais corruptos como “recolha”, a prática de cobrar propina era feita, segundo a lista encontrada na residência de Bombom, em casas de prostituição — especificadas nas planilhas como “puteiros” –, casas de jogos ilegais, desmanches de veículos, postos de combustíveis e lojas de celulares, nas quais eram vendidos aparelhos provenientes de supostos contrabandos.

Os valores eram pagos, nesses casos, para que os negócios clandestinos, ou com irregularidades, pudessem ser  administrados sem interferência policial.

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Marcelo Marques de Souza, o Bombom, investigador classe especial da Polícia Civil

Marcelo Marques de Souza, o Bombom, investigador classe especial da Polícia Civil
Bombom comprou apartamento em prédio de alto padrão
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Dinheiro apreendido na casa do policial preso

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Marcelo Marques de Souza, o Bombom, investigador classe especial da Polícia Civil

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Marcelo Marques de Souza, o Bombom, investigador classe especial da Polícia Civil

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Bombom comprou apartamento em prédio de alto padrão

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8 de novembro – O empresário Antônio Vinicius Gritzbach é assassinado a tiros no Aeroporto de Guarulhos. A autoria do crime seria do PCC

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PM da ativa que executou Gritzbach a mando do PCC é preso

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Com seis páginas, a lista de Bombom teria rendido, somente em um mês, R$ 518.200, como mostra investigação da Polícia Federal (PF) obtida pelo Metrópoles.

De R$ 2 mil a R$ 100 mil

Mas as propinas constantes na lista não se restringem somente aos estabelecimentos ilegais. Nela, também constam locais como um salão de cabeleireiro, por exemplo.

O comércio, localizado na zona leste da capital paulista, pagou R$ 2.000 de propina, dividida em duas partes na planilha (uma de 80% e outra de 20%). Os percentuais são a base para a divisão de todos os valores arrecadados pelos corruptos, como sugere o relatório da PF. Há ainda outro extremo, de um homem, que sozinho pagou R$ 100 mil. Na planilha não é especificado qual seria o comércio dele.

Os valores — do total extorquido de todos os alvos — eram divididos entre os policiais que compunham a quadrilha, da qual Bombom fazia parte.

No dia em que a lista foi apreendida,  o policial civil também foi preso. Ele ocupava, na ocasião, o cargo de chefe de investigações do Corpo Especial de Repressão ao Crime Organizado (Cerco), da 5ª Delegacia Seccional da capital paulista, cuja área de atuação é a zona leste paulistana.

Policiais presos

Também em 17 de dezembro, foram encarcerados o chefe de investigações Eduardo Monteiro, o delegado Fábio Baena, e o investigador Marcelo Roberto Ruggieri, o Xará.

Seis dias depois, o agente de telecomunicações da Polícia Civil Rogério de Almeida Felício, o Rogerinho, se entregou à polícia de Santos, no litoral paulista. Ele compõe o núcleo liderado por Eduardo Monteiro e Fábio Baena, que atuavam no Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) quando tentaram extorquir milhões de reais de Vinícius Gritzbach, para livrá-lo de uma investigação sobre o assassinato de dois membros do PCC.

Antes de ser assassinado, Gritzbach fez um acordo de delação premiada, prestando depoimento ao Ministério Público de São Paulo (MPSP). Após isso, ele também falou com a Corregedoria da Polícia Civil, oito dias antes de ser executado. Seus relatos, sobre os quais apresentou provas,  foram usados para investigar e prender o bando de policiais civis, além de advogados ligados à maior facção do país.

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Entendendo as planilhas

No inquérito instaurado pela PF, é explicado como a tabela de propinas foi interpretada pelos investigadores (veja galeria acima). As colunas são divididas em cores, meses e dias, além de siglas para indicar o tipo de alvo.

No caso do homem que pagou R$ 100 mil à quadrilha, R$ 50 mil foram relacionados em uma célula azul, em outra da mesma cor, mais clara, R$ 10 mil e, numa coluna rosa, R$ 40 mil.

A investigação identificou que a letra “B” referia-se a casas ilegais de jogos, como bingos e poker; já PT era uma referência aos “puteiros”, “DES” aos desmanches e “GAS” a postos de combustíveis.

“Na maioria das vezes, os alvos da ‘recolha’, isto é, os que atuam à margem da lei e pagam a propina, são indicados por advogados criminalistas”, destaca relatório da PF, identificando Ahmed Hassan Saleh, o Mude, como um desses advogados.

Mude, acrescenta o relatório, participava também do “branqueamento”, ou seja, da lavagem do “dinheiro espúrio”. Ele — também preso pela PF — foi acionista da empresa de ônibus UpBus, que opera linhas na zona leste de São Paulo, e é acusado de lavar dinheiro do PCC.

Ahmed Hassan já havia sido alvo da Operação Decurio, em agosto do ano passado, em uma investigação sobre a infiltração da maior facção criminosa do país nas eleições.

As defesas dos suspeitos mencionados nesta reportagem não foram localizadas. O espaço segue aberto para manifestações.

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