Número de mortos pela PM de SP quase dobra em 2024, aponta estudo

São Paulo — Um estudo realizado pelo Instituto Sou da Paz apontou que o número de mortes em decorrência de intervenção policial quase dobrou em 2024 no estado São Paulo. É o segundo ano seguido que o dado registra crescimento. O período corresponde ao início do mandato do atual governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

De acordo com o levantamento, o estado vinha em uma sequência de três anos seguidos em queda de mortes cometidas em serviço pela Polícia Militar (PM). Porém, o ano de 2023 já registrou um aumento de 37,9% quando comparado ao ano anterior e, em 2024, o crescimento dos casos saltou para mais de 84%.

Imagem colorida de gráfico com dados de mortes em decorrência de intervenção policial. Metrópoles
Policiais militares em serviço mataram quase o dobro em 2024

De acordo com a diretora executiva do Sou da Paz, a sequência crescente de casos é resultado do desmantelamento de uma série de medidas que controlavam o uso da força da PM do estado.

“Desde o início de 2023, e agora de forma ainda mais intensa em 2024, temos visto no estado uma política de segurança pública pautada no confronto, que produz mais letalidade das polícias, mas também em maior vitimização dos policiais”, analisa Carolina. “É uma escolha política, evidenciada tanto pelos dados de letalidade policial, como pelo esvaziamento das medidas de profissionalização do uso da força implementadas entre os anos de 2020 e 2022″.

Um gráfico disponibilizado pelo instituto mostra a sequência de aumentos. Apesar disso, o número de 2024 ainda não supera o mostrado em 2019.

No ano passado 720 pessoas foram mortas por PMs, em serviço e de folga. O número é 42% maior do que comparado às 507 vítimas registradas em 2023. Se considerar apenas os dados referentes aos agentes em serviço esse dado aumenta ainda mais.

Em 2024, 650 pessoas foram mortas por policiais em serviço no estado de São Paulo, um aumento de 84,1% no intervalo de um ano quando comparado com as 353 vítimas de 2023.

Ainda segundo o instituto, os dados foram colhidos a partir da disponibilização mensal da Secretaria da Segurança Pública (SSP).

Também com base nas estatísticas disponibilizadas pela pasta, o levantamento apontou que, entre 2019 e o primeiro semestre de 2020, período anterior às implementações das medidas do controle do uso de força da PM, a corporação chegou a matar, em média, 77 pessoas por mês.

Posteriormente, de julho de 2020 a dezembro de 2022, o número médio chegou a 43 por mês. O instituto aponta a implementação das medidas do controle do uso de força da PM como um fator para a queda de aproximadamente 44% dos dados. O recorte temporal analisado também é correspondente ao período em que o país vivia a pandemia da Covid.

Em 2023, com o início da gestão Tarcísio, o levantamento diz que as medidas da PM foram enfraquecidas pelo governador e, juntamente com a realização de duas operações “altamente letais” (Escudo, em 2023, e Verão, no início de 2024), foram responsáveis para o aumento na média mensal de mortes em decorrência de intervenção policial para 55, com picos elevados em meses como fevereiro e outubro de 2024 — com 88 e 96 pessoas assassinadas, respectivamente.

O estudo também aponta um levantamento regional. Na Grande o São Paulo, houve um aumento de 110% na letalidade da PM em serviço. Um crescimento de mais de 149 vítimas mortas no decorrer de 2024 em comparação com o ano anterior.

Em números absolutos o maior salto na letalidade policial se deu na área do Deinter 6, em Santos, no litoral. A unidade policial registrou 52 vítimas a mais em 2024 do que em 2023. O instituto aponta a realização de duas operações definidas como “mais letais da Polícia Militar do Estado de São Paulo”: a Operação Escudo, que deixou 28 mortos entre julho e agosto de 2023; e a Operação verão, que matou 59 pessoas,  entre elas, três policiais militares, com início em janeiro de 2024.

Somadas as mortes cometidas em serviço pela PM da capital, região metropolitana de São Paulo e os municípios do Deinter 6 – Santos (Baixada Santista), representam 63% de todas as vítimas mortas em decorrência de intervenção policial.

Unidades policiais de SP

Na capital paulista, 15 dos 100 distritos policiais da cidade concentram um total de 88 vítimas mortas por policiais militares em serviço em 2024. O número representa 47,8% de todas as 184 mortes deste tipo na cidade de São Paulo.

Imagem colorida de gráfico de São Paulo. Metrópoles
Unidades policiais da zona norte registram mais casos de mortes por policiais

Ao analisar os batalhões da Polícia Militar do estado, dentre as 15 unidades com maior número de assassinatos, com exceção do 20° BPM/I, todas registraram aumento da letalidade, entre 2023 e 2024. Alguns dos batalhões tiveram um crescimento de mais de cinco vezes no número de vítimas do ano anterior, caso doo 18° BPM/M — que cobre a zona norte de São Paulo — e o 34° BPM/I — na região de Bragança Paulista.

As Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) apareceu com a maior letalidade em serviço e matou 23 pessoas a mais em 2024, comparado com 2023, um aumento de 71,9%. Se comparar o ano analisado com 2022, a Rota matou nove vezes mais pessoas.

Diminuição nas investigações

Ainda de acordo com o levantamento, houve uma queda na instauração de procedimentos administrativos entre 2023 e 2024. O Conselho de  Disciplina, procedimento instaurado para avaliar se praças devem permanecer no serviço ativo, por exemplo, diminuiu em 2024 quase 50% em comparação a 2023 e 2022.

“Num período em que houve aumento tão significativo do uso da força letal, em que o estado de São Paulo passou por casos tão emblemáticos de uso excessivo da força e outros procedimentos, como caso do rapaz que foi jogado da ponte, fica a pergunta sobre o que pode explicar tamanha redução. Seria esperado que o padrão, ao menos, se mantivesse, uma vez que processos disciplinares fazem parte da estrutura de controle e profissionalização sobre o uso da força”, questionou Carolina Ricardo.

Imagem colorida de gráfico indicando diminuição nas investigações policiais a respeito de mortes em decorrência de intervenção policial. Metrópoles
Investigações a respeito dos casos de mortes em decorrência de intervenção policial diminuíram em 2024

Perfil das vítimas

  • O estudo afirma que, ao analisar o perfil etário das vítimas, o maior aumento percebido em 2024 é entre aqueles com idades de 16 a 18 anos e de 30 a 39 anos, faixas que duplicaram em relação às vítimas da PM. As faixas etárias correspondem a cerca de 60% dos mortos pela Policia Militar em serviço.
  • O número de adolescentes também é destacado. Em 2024, 50 foram mortos pela ação da PM. O número é maior que a soma de 2022 e 2023 — 43 adolescentes foram mortos pela polícia nestes dois anos.
  • Em relação a cor de pele das vítimas, 31,5% dos mortos eram brancos, 53% eram pardos e 9,8% pretas. Assim, no total, as pessoas negras compuseram 62,9% de todas as vítimas de mortes cometidas em serviço por policiais militares do estado de São Paulo em 2024.

O que diz a SSP

Questionada, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que a atual gestão investe na aquisição de equipamentos de menor potencial ofensivo, como armas de incapacitação neuromuscular, “com o objetivo de mitigar a letalidade policial”.

A pasta ainda disse que pune de forma exemplar os policiais militares que “infringem a lei desobedecem seus protocolos”. Como exemplo, a SSP diz que 295 policiais militares foram demitidos ou expulsos.

A pasta também afirmou que as mortes decorrentes de intervenção policial caíram de 59 para 38 (somando agentes em serviço e de folga), em comparação com o mesmo período do ano anterior.

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