Os outros não são culpados pelo que você faz de errado

Elias da Anunciação – observador do cotidiano

Há pessoas que vagam pelo mundo como se carregassem um mapa rasgado, sem bússola ou destino. São figuras desorientadas, solitárias, presas em um labirinto interno de dúvidas e conflitos que as consome. Elas tropeçam na própria existência, sem saber o que fazer, para onde ir ou como preencher o vazio que ecoa em seus dias. Vivem em guerra consigo mesmas – um diálogo incessante de autocrítica, culpa e arrependimentos – e, inevitavelmente, essa batalha transborda, respingando nos outros em forma de mal-entendidos, brigas ou um isolamento que afasta qualquer tentativa de conexão.

Você já as viu, talvez sem perceber. São aqueles que olham para o horizonte sem enxergar nada, que respondem “estou bem” com um sorriso forçado que não engana ninguém. Carregam uma sensação de deslocamento, como se não pertencessem a lugar algum – nem à família que os cerca, nem aos amigos que tentam alcançá-los, nem ao mundo que segue girando, alheio ao seu caos.

Estão presas entre o que foram, o que são e o que nunca conseguiram ser, sufocadas por expectativas que não sabem se são suas ou impostas por outros. É uma solidão profunda, não apenas pela falta de companhia, mas pela ausência de si mesmas.

O conflito é o pão de cada dia dessas almas perdidas. Consigo, questionam cada escolha, cada passo, como se a vida fosse um erro contínuo a ser corrigido. Com os outros, projetam suas inseguranças em discussões banais ou silêncios cortantes, afastando quem poderia ajudá-las. São mestres em construir muros, mas péssimas em derrubá-los. Vivem num estado de paralisia emocional, onde o medo de falhar é maior que o desejo de tentar, e o peso do passado as impede de olhar para frente.

A resignação passiva

A essas pessoas falta, antes de tudo, aceitação. Não a resignação passiva, mas a coragem de se olhar no espelho e reconhecer quem são – com todas as falhas, cicatrizes e sonhos partidos. Sem isso, continuam fugindo de si mesmas, alimentando o ciclo de desorientação. Aceitar não é se conformar, é o primeiro passo para reconstruir.

Falta também propósito, um fio condutor que dê sentido ao caos. Não precisa ser grandioso – pode ser cuidar de uma planta, ajudar um estranho, aprender algo novo. Um propósito, por menor que seja, é a âncora que impede o barco de ser levado pela correnteza da apatia. Essas pessoas precisam de algo que as tire da introspecção destrutiva e as conecte ao mundo, mesmo que aos poucos.

Outro ingrediente essencial é conexão. A solidão as engole porque elas se fecharam para os outros, seja por medo de rejeição ou por não se acharem dignas de afeto. Reconstruir pontes – com amigos, família ou até um terapeuta – é vital. Ninguém se encontra sozinho; o outro, com seu olhar externo, pode ser o espelho que elas evitam encarar.

A chave da liberdade

Por fim, falta ação. Elas estão presas na análise paralisante, ruminando o que deu errado sem dar o primeiro passo para mudar. Seguir em frente exige movimento, mesmo que pequeno: levantar da cama, pedir ajuda, arriscar um “não”. A vida não espera por quem só contempla o abismo.

Essas almas perdidas não estão condenadas. O que as separa da paz é a disposição de enfrentar o desconforto da mudança. Falta-lhes dar um salto de fé – em si mesmas, nos outros, no futuro. Enquanto não o fizerem, seguirão vagando, desorientadas, mas com a chave para a liberdade guardada no próprio bolso, esperando o dia em que decidirão usá-la.

The post Os outros não são culpados pelo que você faz de errado appeared first on Ver-o-Fato.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.