Como Tarcísio pode ajudar Bolsonaro em julgamento sobre golpe no STF

São Paulo – Testemunha de Jair Bolsonaro (PL) no julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), coleciona argumentos para ajudar na defesa do ex-presidente. Segundo aliados, a boa relação do governador com ministros da Suprema Corte e a aproximação de Tarcísio e Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2022 são os atributos que qualificam o governador para auxiliar a defesa.

A ida do governador à Corte como uma testemunha, no entanto, é vista com maior valor na arena política do que na Justiça e pode servir como uma “vacina” a críticas de eleitores bolsonaristas sobre a interlocução de Freitas com ministros do STF, colocados por Bolsonaro como inimigos de seu governo.

Na quarta-feira (26/3), a primeira turma do STF aceitou, por unanimidade, a denúncia contra o ex-presidente e mais sete denunciados por tentativa de golpe de Estado. Eles se tornaram réus por organização criminosa armada, golpe de estado, tentativa de abolição violenta do estado democrático, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado contra o patrimônio da União. A condenação pode ser de até 43 anos de prisão.

Na véspera do início do julgamento, Bolsonaro e Tarcísio participaram juntos de um podcast com quase quatro horas de duração. O governador elencou os motivos pelos quais aceitou ser testemunha. Um deles é a gratidão por Bolsonaro ter aberto as portas na política para o governador de São Paulo, primeiro como ministro da Infraestrutura e, depois, na disputa pelo Palácio dos Bandeirantes. Outro é a proximidade com o ex-presidente.

“Quando me perguntaram agora se eu seria testemunha de defesa do presidente, eu disse claro. Óbvio que vou ser. E por uma razão simples: acompanhei Bolsonaro ao longo da presidência dele e, de certa forma, tive o privilégio de ser um dos ministros mais próximos do presidente”, disse Tarcísio em entrevista ao podcast Inteligência Ltda.

“Quantas vezes eu vi o presidente arquitetando, armando alguma coisa que estivesse fora da Constituição? Nunca. Esse papo nunca houve. Eu era um ministro próximo e nunca vi nada disso, nenhum movimento”, acrescentou o governador.

Segundo aliados, Bolsonaro passou muito tempo com Tarcísio na campanha eleitoral de 2022, e isso pode ser um “trunfo” do governador de São Paulo como testemunha. Com o pupilo crescendo nas pesquisas, a campanha bolsonarista deu foco para o estado e os dois fizeram diversas agendas em conjunto em cidades da região metropolitana de São Paulo e do interior.

Relação com ministros do STF

Um ex-ministro de Bolsonaro disse, em conversa reservada, que Tarcísio é, talvez, a principal esperança que o ex-presidente tem para ter algum alívio no julgamento. O governador tem bom trânsito com ministros da Corte, inclusive, com Alexandre de Moraes, relator do caso no STF.

Aliados de Tarcísio, porém, apontam ainda que a boa interlocução com ministros do STF não deve interferir em uma possível mudança de entendimento sobre os crimes apurados. No entanto, avaliam que, politicamente, a figura do governador como uma testemunha de defesa pode ter peso.

A boa relação de Tarcísio com a Corte foi construída ainda quando era ministro da Infraestrutura. Por envolver concessões e questões regulatórias, a área exige sintonia com o STF. Interlocutores do governador também acreditam que Tarcísio já tenha “preparado o terreno” antes do depoimento, dando sinais de que vai se ater aos fatos que presenciou e não entrar em narrativas comuns entre os bolsonaristas.

Além de Moraes, os ministros Kassio Nunes Marques, André Mendonça, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso são tidos como os principais interlocutores de Tarcísio na Suprema Corte. Desses, apenas Alexandre de Moraes faz parte da primeira turma, a responsável pelo julgamento de Bolsonaro.

Ao lado de Bolsonaro, no podcast que participou, na noite da última segunda-feira (24/3), Tarcísio comentou sua relação com ministros do STF.

“Eu converso com os ministros? Converso. Sempre defendendo os interesses de São Paulo. Quando você é gestor, você está como incumbente, você vira governador, você tem que defender os interesses e, muitas vezes, você tem que defender no tribunal”, afirmou Tarcísio. “Não é uma proximidade, é uma relação institucional”, acrescentou.

A “relação institucional” no STF rendeu frutos à gestão de Tarcísio no governo paulista. Na Suprema Corte, Tarcísio conseguiu garantir a regularização fundiária no Pontal do Paranapanema, região paulista conhecida por assentamentos do Movimento Sem-Terra (MST).

A interlocução do governador também foi importante nos julgamentos sobre a constitucionalidade das escolas cívico-militares, as parcerias público-privadas das escolas estaduais e a privatização da Sabesp. “Nós ganhamos no Supremo Tribunal Federal. E por quê? Porque às vezes a gente conversa, a gente leva argumentos”, respondeu Tarcísio.

“Testemunha de precedente”

Outro interlocutor disse que Tarcísio pode servir mais como uma “testemunha de precedente” do que “testemunha de fato”, já que o governador tende a não se arriscar a contar versões que possam contrariar provas mais robustas da investigação.

Diante disso, Tarcísio tende a narrar sua relação com Bolsonaro ao longo do mandato e reforçar a ideia de que, como um auxiliar próximo, nunca ouviu sobre planos de golpe de estado.

Na cronologia da trama golpista traçada pela Polícia Federal e pela Procuradoria-Geral da República (PGR), as articulações para uma possível “virada de mesa” em caso de derrota já estariam acontecendo durante a campanha, o que naturalmente teria chegado a Tarcísio naquele momento.

Ex-ministros e testemunhas

Tarcísio de Freitas não é o único ex-ministro de Bolsonaro que será testemunha do ex-presidente no STF. O senador Ciro Nogueira (PP-PI), que foi chefe da Casa Civil, também foi arrolado, assim como o líder da oposição no Senado Rogério Marinho (PL-RN), antigo ministro do Desenvolvimento Regional. O ex-vice-presidente e também senador, Hamilton Mourão (Republicanos-RS), também deve ser testemunha.

O deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ), que comandou o Ministério da Saúde de Bolsonaro, também testemunhará a favor do ex-presidente. Gilson Machado, ex-ministro do Turismo, é outro integrante do governo Bolsonaro que irá ao tribunal defender o antigo chefe. Ele assistiu ao julgamento dessa quarta-feira no gabinete do senador Flávio Bolsonaro, ao lado do ex-presidente tornado réu.

No fim da tarde, Machado ainda estava ao lado de Bolsonaro. Ao Metrópoles, o “sanfoneiro” disse que fora dos tribunais o ex-presidente seguirá viajando pelo país para demonstrar sua força junto aos eleitores. Integrantes do entorno de Bolsonaro, no entanto, afirmam que, após o ato esvaziado na Orla de Copacabana em 16 de março, a manifestação na Avenida Paulista em 6 de abril será um termômetro sobre a eficácia da estratégia de ir às ruas para demonstrar adesão do povo.

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