Carnaval em SP: saiba o que é preciso fazer para botar um bloco na rua

São Paulo — Sérgio Sampaio cantou, em 1973, que queria botar o seu bloco na rua. Se, como ele, você está cansado dos bloquinhos de Carnaval de São Paulo que não combinam com você, e decidiu montar um desfile por conta própria, o Metrópoles descreveu o passo a passo do que é preciso fazer para se inscrever na programação.

Os ritmistas André Machado e Gustavo Gothardo, fundadores do bloco estreante Amor Barato, passaram por todo esse processo em 2025. Os diretores trouxeram algumas dicas e recomendações para além do edital oficial e ressalvas sobre as regras da Prefeitura paulistana para o Carnaval de 2025. Segundo eles, o cronograma planejado pela gestão municipal prejudicou os bloquinhos, alguns, inclusive, tiveram que cancelar seus desfiles por causa da demora das datas oficiais.

O processo de botar o bloco na rua teve início no primeiro semestre de 2024. “Conversamos sobre a ideia, nos reunimos, fizemos algumas projeções, pensamos em estrutura, pensamos em ideia de repertório, artistas e tudo mais”, relembraram os dois. A banda e os mestres começaram a se reunir em julho de 2024 para se prepararem e, em agosto, a bateria também começou a ensaiar. “Foi um processo de meses”.

“A gente ficou aguardando a prefeitura, que é quem disponibiliza essa possibilidade para os blocos, que veio muito tardio, infelizmente, o que atrapalhou muitos blocos”, lamentaram. Como os dois já faziam parte da cena carnavalesca, eles já sabiam que precisavam esperar essa ferramenta da Prefeitura de São Paulo para realizar a inscrição oficial com a autorização da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), da data, hora e local.

Após baterem o martelo sobre fundar o bloco, vieram as primeiras escolhas, que foram a homenagem à Chico Buarque, o nome do bloco, a escolha do repertório baseada em artistas contemporâneos à eles e a criação do logo e da identidade visual do Amor Barato. “Quando a gente pensa na estruturação do bloco, a gente tem que pensar, quantidade de pessoas, se o bloco vai ter bateria, quantas pessoas vão tocar, se vai ter um carro […] Essa estrutura toda já foi pensada lá no começo, como proposta do bloco, e já funcionou para a inscrição na Prefeitura, como um projeto mesmo”, explicaram.


Como botar um bloco na rua

  • As datas oficiais do Carnaval de São Paulo em 2025 são 22 e 23 de fevereiro (Pré-Carnaval); 1º, 2, 3 e 4 de março (Carnaval); e 8 e 9 de março (Pós Carnaval).
  • Os blocos, bandas, cordões e assemelhados devem cadastrar seus desfiles em formulário disponibilizado pela Prefeitura.
  • No formulário, é preciso informar detalhes como o itinerário, horário, previsão do número de foliões, identificação das pessoas físicas ou jurídicas responsáveis pelo desfile e perfil do bloco.
  • Para o Carnaval 2025, as inscrições ocorreram em duas etapas, a primeira de 13/12/2024 à 23/12/2024 e a segunda de 2/1/2025 à 10/1/2025.
  • A primeira etapa contempla os blocos que, tradicionalmente, saem no mesmo trajeto. A segunda é para novos blocos e alterações de trajetos.

A Comissão Especial de Organização do Carnaval de Rua 2025 leva em consideração os critérios como localidade inadequada para a estimativa de público, localidade, data e/ou horário já inscrito(s) por bloco com anterioridade de registro histórico e ou tradição cultural, localidade não autorizada para desfile e localidades com restrições de zoneamento, como áreas hospitalares, áreas estritamente residenciais (ZER), áreas de atenção especial (ZAE) e áreas de segurança pública.

André e Gustavo apontaram que a definição do local é super importante, porque vai definir também a possibilidade do bloco angariar patrocínio dos comerciantes locais, dos bares e de outras instituições. “Essa foi uma das maiores dificuldades, sem dúvida nenhuma, porque a prefeitura só nos deu a possibilidade de saber onde iríamos desfilar 1 mês antes do desfile […] Saber onde desfilar o mais antes possível é fundamental para estruturar o bloco.”

Uma das informações do guia de regras que foi enviado aos blocos que estavam tentando se inscrever na programação oficial do Carnaval era que nenhum bloco novo poderia se inscrever nos períodos de Pré-Carnaval e Pós Carnaval, por serem as datas com a maior quantidade de desfiles. Porém, a portaria que a prefeitura soltou, se baseando neste mesmo guia de regras, dizia que blocos novos só estariam negados de se inscrever nos períodos em questão nas subprefeituras Sé, Lapa, Pinheiros e Vila Mariana.

André e Gustavo haviam, em um primeiro momento, enviado uma opção de trajeto para a Prefeitura, que rebateu com uma opção diferente, mas que funcionava para eles, tanto que é o trajeto que o Bloco Amor Barato vai fazer no sábado (22/2). Os fundadores explicaram que a comunicação com a gestão municipal sobre essas questões foi bem direta, através de uma central focada no Carnaval no WhatsApp.

Para inscrever o seu bloco na programação oficial, a Prefeitura de São Paulo orienta que os responsáveis pelo bloco realizem uma visita técnica de avaliação ao local pretendido para o desfile, levando em conta as condições da via, como pavimentação, calçamento, fiação e mobiliário urbano; as restrições físicas do local, como entradas e saídas de garagem e locais com risco de queda; e observar o funcionamento do comércio local.

A Prefeitura reitera que, é obrigatório para os blocos que reúnam simultaneamente mais de 15 mil pessoas, elaborar um Plano de Operação e Segurança, que deve seguir as diretrizes e autorizações dos órgãos reguladores do poder público, com o objetivo de assegurar a segurança dos foliões durante todo o período do desfile.

No ato da inscrição, os blocos manifestam seu desejo de participação no Carnaval de Rua 2025 usufruindo dos benefícios previstos, como subsídio para pagamento de taxas da CET, apoio com infraestrutura de banheiros e limpeza pública.

André e Gustavo relataram que tiveram que estimar a expectativa de público no dia do desfile para que a Prefeitura possa distribuir os banheiros químicos na região, decidir quais ruas serão fechadas e por quanto tempo, e a questão do policiamento.

Regas gerais

Os desfiles que contam com trios elétricos ou veículos, devem, obrigatoriamente, ter isolamento feito com cordas que abranjam todo o perímetro em volta dos carros. As equipes de isolamento na corda deverão manter resguardada a distância mínima entre os veículos e o público durante todo o deslocamento do bloco.

André XXXX, um dos fundadores do Amor Barato, detalhou quais são os passos para inscrever um bloco na programação da Prefeitura de SP - Metrópoles
Isolamento de trios e veículos de apoio

A Comissão Especial de Organização do Carnaval de Rua 2025 informa que, impreterivelmente, o encerramento dos desfiles e desligamento dos equipamentos de som deve acontecer até às 18h, para que o público se disperse até às 19h. Os blocos de São Paulo possuem tempo limite de 5 horas para realizarem seus desfiles, sendo 1 hora de concentração, 3 horas de desfile e 1 hora de dispersão.

Segundo André e Gustavo, a ideia de desfilar às 9h do sábado de Pré-Carnaval já partiu deles. “A gente entende que o desfile de manhã é muito mais tranquilo, porque a tarde sempre tem muito mais chance de chuva, as pessoas estão muito mais bêbadas, então, a confusão é muito mais fácil de acontecer, infelizmente, acontecem assaltos, às vezes, arrastões”, avaliaram.

“A gente entendeu que fazer de manhã seria muito mais gostoso de participar e de organizar”, disseram. Os diretores do Amor Barato acreditam que o fato de eles terem escolhido esse horário os ajudou porque, como em São Paulo não há a tradição dos blocos saírem cedo, eles conseguiram usar um circuito que é tradicional do Butantã, o que não seria possível se tivessem escolhido um horário conflitante com blocos “antigos”.

Se eles tivessem escolhido um horário ou local conflitante com outro bloco, eles teriam que mudar seu desfile porque, de acordo com as regras, a Prefeitura sempre dá preferência para os blocos já existentes. “Se um bloco novo se inscreve no mesmo trajeto e horário que um existente, o novo que vai ter a necessidade de trocar. O que já existiu, que já criou algum tipo de raiz, algum tipo de tradição ali, se mantém”, explicaram.

Os trios e/ou caminhões devem ter dimensões compatíveis com as características das vias escolhidas para o desfile, contando também com o raio de giro, para conversões e manobras para que não fiquem bloqueados. São permitidos equipamentos de som, trios elétricos e
assemelhados, com altura total do veículo de 4,40 metros, incluindo cobertura montada e pessoas embarcadas. Para utilizar veículos com altura superior a isso, é preciso de Autorização Especial de Trânsito (AET), que deve ser solicitada na Gerência de Transportes Especiais (GTE).

André XXXX, um dos fundadores do Amor Barato, detalhou quais são os passos para inscrever um bloco na programação da Prefeitura de SP - Metrópoles
São permitidos equipamentos de som, trios elétricos e assemelhados, com altura total do veículo de 4,40 metros, incluindo cobertura montada e pessoas embarcadas

Os responsáveis pelos blocos precisam observar a existência de viadutos, passarelas, fiação, rede aérea, sinalização semafórica ou árvores de grande porte, para que durante as apresentações, os trios não fiquem bloqueados. Equipamentos de som, trios elétricos ou semelhantes com mais de 3 metros de altura não serão permitidos no Carnaval de Rua de São Paulo.

André e Gustavo explicaram que a questão da quantidade e do tamanho dos carros é decidida de acordo com o tamanho do bloco. “Tem toda uma questão de segurança: se você sai com um trio elétrico, precisa de corda, se não sai, não precisa […] A escolha de tudo isso também influencia no planejamento”, falaram. Segundo os fundadores, a banda foi formada com pessoas conhecidas e, desde o ano passado, eles começaram a buscar um trio para alugar no dia do desfile. “Como esse ano a Prefeitura demorou muito para autorizar, divulgar a agenda oficial e até para inscrever os blocos, sobrou pouquíssimo tempo”, lamentaram.

“Essa foi uma dificuldade grande, que influenciou na questão do trio. Nós escolhemos um trio que, pelo nosso entendimento, atende a nossa possibilidade. É um trio que a banda vai no meio, porque nas ruas do Butantã, naquelas ruas pequenas, tem fio [de eletricidade] baixo”, contaram. Para eles, a questão é que se a Prefeitura não tivesse aceitado a inscrição do bloco e mudassem o desfile deles de lugar, o trio poderia não ser adequado e eles não teriam tempo o suficiente para conseguir um novo.

Desmontagem do bloco

O período máximo para desmontagem do bloco é de 1 hora após o horário de término da dispersão do desfile. A desmontagem deve ser feita nas vias não utilizadas como trajeto do desfile, devendo estacionar o trio em área que não interfira nos acessos de moradores e comércios, com o mínimo de prejuízo ao trânsito local.

A Prefeitura de São Paulo incentiva que os bloquinhos tenham operações que incluam coleta seletiva, participação de catadores e
iniciativas de limpeza urbana, envolvendo parcerias com centrais de triagem e programas de reciclagem.

Restrições

São restritas quaisquer manifestações carnavalescas em logradouros públicos com cobrança de ingresso, exigência de qualquer valor para sua fruição ou venda de produtos e abadás. O descumprimento das obrigações gerais e normas aqui expostas, assim como de outras disposições e/ou desrespeito às normas municipais, poderá ser alvo de sanção, reitera a Comissão Especial de Organização do Carnaval de Rua 2025.

A São Paulo Turismo (SPTuris), que reiterou ao Metrópoles que não são cobradas taxas pela Prefeitura, pois o evento é coordenado diretamente pela municipalidade. Além disso, afirmou que não há penalidades previstas no regramento deste ano.

Custo do Carnaval de São Paulo

“O custo do Carnaval, o custo de você botar um bloco na rua é alto. Você tem uma série de fornecedores do Carnaval. O carnaval movimenta bilhões. Mas, ele não é visto como um investimento altamente rentável pra cidade. Então, todo o investimento que é feito, é feito por nós, ritmistas, nós que temos essa paixão pelo Carnaval”, avaliaram André e Gustavo.

Para os fundadores do Amor Barato, isso é uma questão que restringe a “festa do povo” a quem pode pagar, tornando o Carnaval um feriado excludente e, por isso, indo totalmente contra a ideia do Carnaval e do samba. Eles avaliam que o expectativa de público para seu desfile poderia ser muito maior se eles tivessem a possibilidade de ter um financiamento. “A gente traz muita gente para a rua, muita gente para a cidade”, disseram.

Um dos exemplos citados pelos ritmistas foi a questão dos cordeiros: a Prefeitura obriga o bloco a colocar uma corda nos blocos com trio elétrico, mas não arca com as despesas disso e não são todos os blocos que conseguem patrocínio ou fomento para bancar esses custos. “A questão de segurança deveria estar com a Prefeitura, com o Governo do Estado. Não terceirizada com o bloco de Carnaval”, avaliaram.

Uma grande questão, para os diretores, com relação à inscrição é você ter o seu desfile confirmado pelo Diário Oficial com menos de 30 dias para a data. “Isso atrapalha em muito e, na realidade, inviabilizou uma série de blocos […] Seria maravilhoso, esse ano, porque foi o recorde de inscrições, consolidando cada vez mais o Carnaval de Rua de São Paulo, mas […] Muito em cima da hora, fica difícil conseguir patrocínio e tem bloco que desiste.”

Como nasceu o Bloco Amor Barato

André e Gustavo se conheceram quando o segundo era mestre de bateria e foi professor repinique do primeiro. Juntos, eles participaram do bloco Sou Chico, que homenageava Chico Buarque e, devido à pandemia, não existi mais. “Ficou aquela vontade de ter um bloco com um repertório parecido e que também trouxesse um pouco de características paulistanas, como a arte de rua e o piche”, contaram.

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Os ritmistas André Machado e Gustavo Gothardo, fundadores do bloco estreante Amor Barato, passaram por todo esse processo em 2025

Após baterem o martelo sobre fundar o bloco, vieram as primeiras escolhas, que foram a homenagem à Chico Buarque, o nome do bloco e a criação do logo e da identidade visual do Amor Barato
Eles batizaram o bloquinho em homenagem à uma música de Chico Buarque porque, de acordo com eles, ela resume bem o que eles pensam
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André e Gustavo, fundadores do Amor Barato, detalharam quais são os passos para inscrever um bloco na programação da Prefeitura de SP

Rodrigo Freitas/ Metrópoles

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Os ritmistas André Machado e Gustavo Gothardo, fundadores do bloco estreante Amor Barato, passaram por todo esse processo em 2025

Arquivo pessoal

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Após baterem o martelo sobre fundar o bloco, vieram as primeiras escolhas, que foram a homenagem à Chico Buarque, o nome do bloco e a criação do logo e da identidade visual do Amor Barato

Arquivo pessoal

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Eles batizaram o bloquinho em homenagem à uma música de Chico Buarque porque, de acordo com eles, ela resume bem o que eles pensam

Arquivo pessoal

Foi desta vontade que surgiu na dupla e no terceiro sócio da ideia, Hugo, de fundar o Bloco Amor Barato. Eles batizaram o bloquinho em homenagem à uma música de Chico Buarque porque, de acordo com eles, ela resume bem o que eles pensam. “Esse amor não instagramável, quase vagabundo”, brincaram. Inclusive, a data de fundação do bloco é 19 de junho, aniversário do cantor.

“Quando você cita Chico Buarque, você não precisa explicar muito que é um bloco político, que é um bloco que pensa de maneira progressiva e com engajamento, é um bloco que pensa as questões sociais que margeiam o Carnaval e um bloco que nasceu com os seus diretores na periferia de São Paulo, que está ligado à arte de rua, à pixação”, contaram os ritmistas.

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