Diárias do STF: especialistas apontam privilégio a juízes em Brasília

São Paulo — “Privilégios” e “práticas condenáveis”. Assim estudiosos do Poder Judiciário consultados pelo Metrópoles classificaram o pagamento mensal de R$ 10,5 mil em diárias a juízes auxiliares do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que já receberam auxílios para se mudarem à capital federal.

JUÍZES DO STF E DO CNJ TÊM RECEBIDO DIÁRIAS EM ACÚMULO COM AUXÍLIO-MUDANÇA - METRÓPOLES
Juízes do STF e do CNJ recebem diárias mensais de R$ 10,5 mil como se fossem um “auxílio-moradia” turbinado

Como revelou o Metrópoles, o pagamento de um limite de 10 diárias de R$ 1 mil tem sido feito como uma espécie de “auxílio-moradia” turbinado a juízes que auxiliam a cúpula do Poder Judiciário.

As regras para o pagamento do benefício foram alargadas em um julgamento virtual administrativo do STF e em uma decisão a um único juiz que serviu de paradigma no CNJ. Ambos os processos foram liderados pelo ex-presidente de ambos os órgãos, Dias Toffoli, em 2019.

Professor de Ciência Política da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e autor de teses e artigos sobre o Conselho Nacional de Justiça e o Ministério Público, Rafael Viegas afirma que os “entendimento que permite aos juízes escolher entre diárias altas (R$ 10,5 mil) ou um auxílio-moradia de menor valor é problemático, especialmente quando se considera que muitos já residem em Brasília”.

“O pagamento de diárias sob essa justificativa configura, de fato, um benefício adicional que ultrapassa sua finalidade original de cobrir despesas temporárias. Pode, sim, ser considerado um privilégio ou um “penduricalho” em um sistema que deveria evitar práticas patrimonialistas que minam cada vez mais a confiança na Justiça”, diz.

Viegas diz que a “prática de emitir resoluções em julgamentos virtuais administrativos, como o ocorrido no STF em 2019, levanta sérias preocupações sobre a transparência e accountability”. “O fato de essas decisões serem inacessíveis ao público e restritas aos ministros cria um ambiente de opacidade, dificultando o controle externo.”

“A falta de uma resolução do CNJ, substituída por decisões específicas e restritas, como a mencionada no SEI sob a presidência do ministro Toffoli, compromete a segurança jurídica e dá margem a decisões casuísticas que podem ser percebidas como pouco republicanas”, afirma.

Pouca transparência

Doutor em direito (UFMG), mestre em economia (UnB) e autor do livro “O País dos Privilégios”, Bruno Carazza afirma que o caso é “bastante sintomático de várias práticas que são condenáveis observadas no âmbito do poder Judiciário e no Ministério Público”. “Acho que essa questão da concessão das diárias cumulativamente com o auxílio para mudança, que é uma coisa que claramente é redundante, porque como ficou claro naquele relatório de auditoria, ou se deve pagar uma coisa ou a outra.”

Carazza afirma que “há um padrão na expansão dos pagamentos extras que são pagamentos que têm natureza remuneratória apesar da interpretação que se dá como indenizações”.

“É um caso emblemático de uma situação generalizada, a falta de disciplina desses pagamentos, não se é regulamentado claramente, são processos com decisões tomadas com pouca transparência, com pouca justificativa, não se vê amplamente a justificativa para concessão disso. Fere também esses princípios que devem zelar a administração pública, como é o caso da motivação, da transparência, obter esses dados muitas vezes é muito difícil”, diz.

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