Lula torce para que Bolsonaro nem tão cedo abandone a ribalta

A flor mais exuberante do recesso brotou antes que ele tivesse início em meados de dezembro e tão cedo murchará. Ela atende pelo nome de “renúncia de Lula” a se candidatar a presidente outra vez em 2026 – seja por problemas de saúde, seja porque cansou de governar, seja por temer fechar sua biografia com uma derrota.

Uma coisa foi ser derrotado ao disputar a Presidência pela primeira vez em 1989. À época, o PT mal completara nove anos de vida, e Lula mal sabia direito o que fazer caso fosse eleito. O “sapo barbudo”, por um triz, não se elegeu. Chateou-se com isso, era natural, mas logo que se recuperou decidiu seguir em frente.

Vive-se biologicamente uma única vez, mas não na política onde a morte nunca é definitiva. Lula sobreviveu a mais duas derrotas consecutivas, em 1994 e 1998, para finalmente, travestido de Lulinha Paz & Amor, tornar-se o primeiro ex-operário a subir a rampa do Palácio do Planalto como presidente da República.

Fala-se, e o próprio Lula alimenta o falatório, que ele anda com medo de morrer depois dos três sustos recentes que levou. No dia 1º de outubro, ao decolar de volta ao Brasil, o avião que o conduzia teve um problema técnico e sobrevoou a cidade do México durante cinco horas para gastar combustível e aterrissar em segurança.

No dia 19 de outubro, ao cortar as unhas dos pés dentro do banheiro do Alvorada, o banco que o sustentava escorregou e Lula bateu forte com a cabeça no chão, desmaiando. Ao acordar, não conseguia mexer-se. Então pediu a Deus duas vezes para morrer se ficasse tetraplégico. Internado, levou cinco pontos na cabeça.

Finalmente, com fortes dores na cabeça, foi embarcado para São Paulo e operado de emergência na madrugada de 10 de dezembro. Os médicos que o atenderam na unidade de Brasília do Hospital Sírio Libanês suspeitaram que ele tivesse sofrido um AVC.  Lula mal conseguia falar, nem dizia coisa com coisa. Um sufoco.

Foram quase três meses de agonia e de muito medo. Passa bem desde então. O medo reflui, mas não desapareceu de todo. Lula reduziu a jornada de trabalho que já foi de mais de 12 horas por dia, incluindo os fins de semana. Agora, sob os cuidados severos de Janja, sua mulher, chega ao Palácio do Planalto às 10h e sai às 18h.

É o mesmo expediente que deu Bolsonaro nos seus quatro anos de governo. Com a diferença de que Bolsonaro, hoje, tem 69 anos de idade, está inelegível até 2030 e, se condenado pelo golpe que tentou aplicar para derrubar a democracia, dificilmente será mais candidato. Lula tem 79 anos e mais uma eleição pela frente.

A esquerda precisa desesperadamente de Lula para manter-se no poder pelo menos por mais quatro anos. A direita precisa que Bolsonaro saia logo de cena para que ela recupere o poder, se possível no próximo ano, ou o mais tardar em 2030. Para ela, Bolsonaro tornou-se um fardo que só atrapalha seus planos.

Feliz do candidato que pode escolher seu principal adversário. Em 1989, Fernando Collor fugiu de Leonel Brizola (PDT) e escolheu Lula, derrotando-o. Nas asas do Plano Real, Fernando Henrique Cardoso venceria qualquer adversário, e venceu Lula duas vezes no primeiro turno. Em 2022, Lula escolheu Bolsonaro e deu-se bem.

Não importa se preso ou solto: Bolsonaro continuará sendo imprescindível para que Lula possa se reeleger pela última vez.  A condenação de Bolsonaro é certa, a prisão não. O resto dependerá da capacidade de Lula de fazer um governo menos medíocre e mais virtuoso, e do humor dos brasileiros na hora de votar.

 

Leia todas as colunas publicadas no Blog do Noblat (https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/ricardo-noblat)

Adicionar aos favoritos o Link permanente.