Software moderno, Hardware obsoleto (por Luiz Paulo Vellozo Lucas)

O Brasil roda num software financeiro e monetário moderno, de primeiro mundo. Moeda estável, inflação controlada, balanço de pagamentos equilibrado, reservas internacionais, investimento direto estrangeiro expressivo e mercado de capitais dinâmico. Por outro lado este software é forçado a funcionar em um hardware físico e institucional obsoleto. Faltam cidades saudáveis e infraestrutura, fruto de um processo de urbanização desordenada e inconclusa. Nosso federalismo de subserviência gerou déficit de poder local e 12 mil favelas onde vivem 8% dos brasileiros. Os investimentos, o público e o privado, são travados por regulação de baixa qualidade e disputas de poder, políticas e comerciais, judicializadas e mal resolvidas resultando em insegurança jurídica.

Sem a democratização e a abertura comercial teria sido impossível fazer o Plano Real que desenhou e botou pra rodar nosso moderno software monetário e financeiro a partir de 1993. O ano de 1984, o ultimo ano do regime militar, marca também o primeiro ano em que o Brasil apresentou um superávit expressivo na balança comercial. A produção industrial, o agronegócio e o petróleo offshore mudaram a economia e as relações com o exterior. O café deixou de ser o principal produto de exportação e no BNDES dizíamos que havia uma mudança estrutural em curso no Brasil e que era preciso abandonar de uma vez a lógica da substituição de importações. Um estudo da Área de Planejamento do BNDES,  “Cenários para a Economia Brasileira”, apontava que não teríamos mais a restrição externa e desequilíbrios em balanço de pagamentos. O novo desafio deveria ser a “Integração Competitiva” na economia mundial, isto é, desenvolver capacidade de produzir produtos e serviços com padrões internacionais de qualidade e preço.

O governo Lula não tem apreço pelo software monetário e financeiro que roda hoje no Brasil. O PT tem desprezo. Não participou de sua formulação e implantação ao contrario, sempre fez oposição ferrenha ao “projeto neoliberal” a partir de uma visão equivocada de luta de classes anti-mercado. Também não se empenha por uma agenda reformista voltada para a modernização do nosso hardware físico e institucional que agrava sua obsolescência a cada dia que passa.

A extrema direita emergente e anti sistema guia-se pela guerra cultural nas redes sociais, sem qualquer compromisso com nada que não sejam seus projetos de poder. O discurso pró liberdade e pró negócios da nova direita  antiliberal revela-se apenas aparente e superficial ao desconhecer a essência institucional da economia de mercado contemporânea e o valor da confiança para o sucesso das pessoas, empresas, cidades e países.

Por mais que a competição política esteja hoje moldada pela comunicação digital e que a mitologia das celebridades ocupe um espaço de destaque no lugar do debate iluminado por evidências, penso que o calendário eleitoral seja o único caminho a seguir. Apesar da prevalência do mundo digital, a  vida e a atuação dos empresários e dos líderes locais são moldados pela realidade objetiva das cidades e dos mercados que condiciona os resultados dos empreendimentos e a sensação de bem estar das pessoas.

As eleições de 2026 já começaram e as forças politicas que pretendem agir para preservar e manter atualizado nosso software e que também estão ansiosas para enfrentar a agenda reformista voltada para mudar nosso hardware precisam construir um projeto eleitoral viável longe dos radicalismos populistas.

 

 

Engenheiro, Mestre em Desenvolvimento Sustentável , ex prefeito de Vitoria-ES

Adicionar aos favoritos o Link permanente.