Governo Lula segue sem medidas concretas para frear preço de alimentos

Passado mais de um mês desde que integrantes do governo e o próprio presidente Lula (PT) sinalizaram que iriam buscar formas de conter a alta do preço dos alimentos, nenhuma medida concreta foi implementada.

No fim de janeiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a regulamentação da portabilidade do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), que busca atender prioritariamente os trabalhadores de baixa renda. Ele afirmou que a medida, que mexe no vale-alimentação (VA) e no vale-refeição (VR), pode ajudar a baratear os preços.

Haddad e outros ministros de Estado têm sustentado que a queda do dólar e a safra agrícola de 2025 deverão ajudar na queda dos preços dos alimentos. No entanto, esses dois componentes não têm efeito imediato e são sentidos apenas a médio e longo prazo.


Entenda o debate em torno dos preços dos alimentos

  • Enquanto a inflação acumulou alta de 4,83% em 2024, o grupo Alimentação e Bebidas, isolado, subiu 7,69% em 12 meses. Esse grupo contribuiu com 1,63 ponto percentual para a inflação do ano passado.
  • Custos da alimentação (seja ela dentro ou fora do lar) pesam especialmente sobre os mais pobres, que têm seu poder de compra reduzido.
  • O Palácio do Planalto descartou o tabelamento de preços para forçar a queda nos valores dos alimentos.
  • Governo aposta na queda do dólar, que caiu em torno de 10% nos últimos 60 dias, e na safra agrícola de 2025, que deverá registrar recorde.
  • Regulamentação do vale-alimentação, que poderia reduzir as taxas cobradas pelo mercado de benefícios, diminuindo a pressão sobre os preços dos alimentos, ainda não tem previsão de sair.

Enquanto isso, o governo tem buscado medidas que devem ter impacto indireto e limitado, como a manutenção do percentual da mistura do biodiesel ao diesel em 14%. O aumento desse percentual para 15% estava programado para entrar em vigor a partir de 1º de março, o que levaria a uma reação em cadeia.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que a decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) foi tomada com o foco em baratear o preço dos alimentos, “grande prioridade” do governo.

“O preço dos alimentos é a grande prioridade do nosso governo. Considerando a necessidade de buscarmos todos os mecanismos para que o preço seja mais barato na gôndola do supermercado, mantemos a mistura em B14 até que tenhamos resultados no preço dos alimentos da população, já que boa parte da produção do biodiesel vem da soja”, explicou Silveira.

O professor de finanças da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EAESP) Rafael Schiozer argumentou que a comparação entre a inflação de alimentos e a questão dos combustíveis é “muito fraca”. “O impacto direto dos combustíveis é para quem, de fato, usa combustível, dirige carro, dirige caminhão”, diz.

“Tudo que é insumo, que transporta alimento, vai acabar afetando um pouquinho o preço dos alimentos, mas isso é um elemento bem pouco relevante. Tem outras coisas mais importantes, como a safra, entressafra e a demanda”, ressalta Schiozer.

Safra 2025

A médio prazo, o governo aposta fortemente na “supersafra” agrícola prevista para 2025. A estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é de que a produção deste ano registre um crescimento recorde de 8,3% em relação à safra anterior, totalizando 322,47 milhões de toneladas de grãos, especialmente soja e milho — um aumento de 24,62 milhões de toneladas.

Após um ano marcado por eventos climáticos adversos, que impactaram os resultados do campo, a equipe econômica trabalha com um cenário mais positivo neste ano, sem a prevalência de fenômenos como El Niño e La Niña, que amplificam fenômenos climáticos extremos.

O governo ainda monitora o preço dos alimentos para melhor direcionar o Plano Safra deste ano, que visa oferecer financiamento para aquisição de insumos e equipamentos pelo setor agrícola e será lançado em meados do ano. O plano anterior, da safra 2023/2024, terminou com desembolso recorde de R$ 400,7 bilhões em crédito, um aumento de 12% em relação a igual período da safra anterior.

Ainda assim, a ampliação da safra por si só não é suficiente para ajudar na redução dos preços, já que muitas vezes a produção acaba ficando empacada em armazéns ou sendo até mesmo desperdiçada, o que gera prejuízos.

Visando contornar os problemas de escoamento da safra no país, os ministérios dos Transportes, de Portos e Aeroportos e da Agricultura lançaram no início de fevereiro um plano que amplia os investimentos em infraestrutura e logística. Apesar desse anúncio, parte das obras não serão entregues em 2025 e não deverão gerar impactos imediatos, sendo a maioria projetos a médio e longo prazo.

O ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, disse também que a equipe de Lula avalia aplicar juros mais baixos em determinados produtos no âmbito do Plano Safra 2025/2026. A ideia é dar mais estímulo para os produtores.

Regulamentação do vale-alimentação

Como mostrado pelo Metrópoles, um impasse trava a regulamentação do vale-alimentação. O Ministério da Fazenda quer que o Banco Central (BC) assuma a regulamentação do mercado de benefícios, e o BC resiste. A instituição alega não ter condições de regular o mercado, o que não significa que não sejam necessárias regras para seu funcionamento.

A alternativa seria atribuir essa competência ao Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão superior do Sistema Financeiro Nacional composto pelo próprio BC e pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento. O CMN se reúne uma vez por mês.

O mercado alega que as altas taxas cobradas por estabelecimentos geram aumento no nível médio dos preços das refeições, já que elas são repassadas ao consumidor. É daí que vem a ideia de que a pressão dos alimentos seria reduzida.

Impacto no bolso

Apesar de impactar mais fortemente os mais pobres, pesquisa Quaest divulgada no último domingo (16/2) mostrou que as famílias brasileiras de todas as classes sociais notaram a elevação de preços dos alimentos.

Na classe média, 80% considerou que o preço subiu, similar à percepção nas classes baixa e alta, de 79%, cada.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), enquanto a inflação acumulou alta de 4,83% em 2024, o grupo Alimentação e Bebidas, isolado, acumulou alta de 7,69% em 12 meses. Esse grupo contribuiu com 1,63 ponto percentual para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano passado.

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