Musk como Strangelove e o gesto nazista de Bannon: a direita assusta

A Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC, na sigla em inglês), evento anual da direita americana cuja edição 2025 terminou ontem nos Estados Unidos, foi a apoteose do trumpismo, como não poderia deixar de ser.

O momento marcante da CPAC, porém, não foi o do discurso do chefão. Donald Trump é uma redundância permanente na sua autocelebração monocórdica de salvador dos Estados Unidos e, quiçá, da espécie humana — à exceção, aparentemente, dos ucranianos, dos quais o presidente americano parece exigir a rendição aos russos e tencionava praticamente confiscar as reservas de minerais raros, como pagamento pela ajuda militar que Kiev recebeu de Washington.

A imagem que a plateia leva do encontro em Maryland é a de Elon Musk brandindo como se fosse arma a motosserra que lhe foi entregue pelo presidente da Argentina, Javier Milei, em empréstimo do simbolismo da batalha contra o aparato burocrático do que a direita chama de Estado profundo e que ela enxerga como legado exclusivo e maléfico da esquerda à democracia representativa.

Nas suas aparições triunfalistas, com gestualidade um tanto suspeita de simpatias supremacistas e um discurso apocalíptico que considera inevitável a colonizacão de Marte pela humanidade — e o subtexto dessa colonização é eugenista —, Elon Musk está cada vez mais parecido com o Dr. Strangelove, protagonista da sátira cinematográfica do diretor Stanley Kubrick à paranoia da Guerra Fria.

No filme de 1964, o personagem interpretado por Peter Sellers é um conselheiro científico do governo americano. Com sotaque alemão e um braço que parece ter vontade própria para fazer a saudação nazista, Dr. Strangelove é de opinião de que os melhores exemplares da espécie humana devem ser preservados em abrigos nucleares, porque, depois do inevitável inverno que se seguirá à guerra atômica, a humanidade poderá se regenerar e produzir uma raça superior.

A comparação não é minha, mas do professor de literatura francesa Bruno Chaouat, que publicou um artigo no jornal Le Monde.  “Não se trata de fazer aqui a ‘reductio ad Hitlerum’, de acordo com a boa palavra do filósofo Leo Strauss. O nazismo foi um movimento sui generis e acho, pelo menos por enquanto, a nazificação de Musk pouco convincente. Entre a falta de jeito de um geek e o desempenho viril, o seu gesto (de saudação que parecia intencionalmente nazista, na comemoração da vitória de Donald Trump) foi feito a despeito da sua vontade, porque Musk é um homem com uma psique adolescente dublê de grande empresário. Mas, como escreve o filósofo Olivier Rey, ‘a figura mais aterrorizante e repulsiva do nosso tempo é a conjunção da imaturidade psíquica mais completa com os meios de ação sofisticados’”, diz Bruno Chaouat.

Para além de Elon Musk com a motosserra de Javier Milei, a plateia da conferência da americana foi brindada com a saudação nazista do ideólogo Steve Bannon, muito mais evidente  do que a de Elon Musk na vitória de Trump e certamente propositada. Foi tão assustador que o enfant gâté da direita francesa, o convidado Jordan Bardella, desistiu de fazer a sua palestra em protesto contra essa indecência.

Como todos os delinquentes com simpatias nazistas atualizadas, Steve Bannon negou que tivesse feito o gesto com o braço direito e ainda ofendeu Jordan Bardella. A direita radical está mostrando ter uma cara assustadora até mesmo para uma parte da direita radical.

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