Instrutor morto reclamou do avião dias antes de cair em SP, diz mãe

São Paulo — Matheus Henrique Gomes de Toledo, de 25 anos, teria reclamado do avião dias antes de morrer após a queda da mesma aeronave no dia 9 de março, no bairro Gaivotas, em Itanhaém, litoral sul de São Paulo.

Em entrevista ao Metrópoles, a mãe da vítima, Tais Elena de Souza Gomes, contou que o filho, instrutor da aeronave, relatou por meio de mensagens em um aplicativo de conversas que estava com medo de voar de Paranaguá, no Paraná, até Peruíbe, no litoral paulista. Ele estava com a mesma aeronave com que caiu no início de março.

Segundo Tais, que é advogada, o filho tentou ligar, mas a mulher não conseguiu atender pois estava cozinhando no momento. Ao pegar o telefone, viu as mensagens de preocupação de Matheus. Além disso, ela contou que o filho revelou uma espécie de orientação passada pelo aeroclube para que Matheus conseguisse realizar o trajeto:

“Eu até falei ‘filho, não faça nada. Você não é mecânico’”.

A advogada ainda disse que tem tudo isso por escrito e que aguarda o contato das autoridades responsáveis pelas investigações para passar os prints das conversas. Iniciativa que ainda não aconteceu por parte dos órgãos governamentais.

Segundo a matrícula da aeronave na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o avião foi fabricado em 1969, possui um motor convencional, está autorizado a realizar voos diurnos e foi registrado para instrução. De acordo com o documento, o proprietário é Jefferson dos Santos Morales.

Em nota, enviada nas época dos fatos pela Rede Voa, concessionária responsável pelo Aeroporto de Itanhaém, informou que a aeronave fazia um voo de instrução, com decolagem às 17h16, e emitiu alerta às 17h42.

Dias seguidos e jornada longa

Tais também contou à reportagem que até o dia do acidente, Matheus vinha de uma sequência de 34 dias seguidos trabalhando.

“Eu olhava para o meu filho e eu via a parte branca do olho trincada, vermelha de desgaste, de cansaço”.

Além disso, a mulher contou que o filho se apresentava no aeroclube às 5h30 e chegava em casa “no mínimo às 20h”. Segundo o depoimento ao Metrópoles, tinha dias que o filho voltava às 23h para casa, comia, tomava banho e dormia, visto que no dia seguinte tinha que estar no aeroclube cedo novamente. “O tempo que eu tinha com o meu filho era o momento que ele estava comendo”.

Taís definiu as condições de trabalho no aeroclube como complicadas e acredita que o cansaço de Matheus pode ter sido um do “conjunto de fatores” que ocasionaram o acidente. Apesar do desgaste físico e mental mencionado pela advogada, ela diz que o filho “era muito responsável” e que não teria voado se sentisse que o cansaço “poderia contribuir para colocar a vida dele ou do aluno em risco”.

Dia do acidente

A mãe revela que o filho entrou às 5h30, como já era o usual. Posteriormente, a mãe trocou mensagens com o filho. Matheus tinha sobrevoado a casa da família duas vezes naquela manhã e Tais, foi até a área externa da residência e acenou em direção ao avião.

Tais contou que esta era uma prática comum, mas que o filho não costumava ver. Porém no dia 9 de março, o filho percebeu o aceno e respondeu à mensagem da mãe com um “te vi sim”. Esta foi a última conversa dos dois.

No final daquela tarde, Tais recebeu uma ligação do diretor do aeroclube o qual Matheus era instrutor, avisando que o jovem tinha feito um “pouso forçado” no bairro das Gaivotas, próximo a uma aldeia indígena, e que as condições de saúde ainda eram desconhecidas.

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Bombeiros trabalham para resgatar vítima após queda de avião de pequeno porte cai no litoral de São Paulo
Avião de pequeno porte cai durante voo de instrução em Itanhaém, litoral sul de SP
Avião de pequeno porte cai durante voo de instrução em Itanhaém, litoral sul de SP
Praia da Gaivota em Itanhaém
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Queda de avião em Itanhaém

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Bombeiros trabalham para resgatar vítima após queda de avião de pequeno porte cai no litoral de São Paulo

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Avião de pequeno porte cai durante voo de instrução em Itanhaém, litoral sul de SP

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Avião de pequeno porte cai durante voo de instrução em Itanhaém, litoral sul de SP

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Praia da Gaivota em Itanhaém

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Ao receber a notícia, a mulher foi até o local do acidente, mas recebeu das autoridades a recomendação de ir ao Hospital de Itanhaém, visto que os resgatados seriam levados à unidade de saúde.

Horas após chegar no hospital, Taís conta que uma viatura com três policiais militares chegou e os agentes se direcionaram diretamente à ela contando que havia uma pessoa morta no local do acidente e que provavelmente se tratava de Matheus. Apesar de não ter uma confirmação oficial, a mulher passou a ligar para as funerárias de Itanhém, buscando saber onde estava o corpo do filho. Ela não teve sucesso.

Porém em uma das ligações, a mãe foi direcionada por um dos agentes funerários a procurar em funerárias de Peruíbe, visto que o acidente aconteceu no limite entre os dois municípios.

Na primeira ligação à Funesp, localizada em Peruíbe, Tais descobriu onde estava seu filho por volta da 1h do dia 10 de março, mais de sete horas após a queda da aeronave, visto que segundo a mulher, o óbito do filho foi registrado como 17h45. Ela foi ao local, após conseguir uma autorização policial, e encontrou o filho “muito machucado e ensanguentado” no endereço, mas conseguiu se despedir do filho antes do corpo ser levado para o Instituto Médico Legal (IML).

Queda da aeronave

Tais contou que a 50 metros do local da queda havia uma residência habitada pela filha do cacique da aldeia indígena que existe na região.

“Eu tenho a impressão que isso foi obra do meu filho, de tentar livrar a residência, tentar livrar o aluno dele, mas ele, pelo tempo de reação da altura que estava o avião ao solo, eu sinto que ele não conseguiu se salvar por conta disso”.

Veja vídeo do acidente:

 

O aluno de Matheus, Rodrigo do Nascimento Silva, de 22 anos, sobreviveu a queda. Tais revelou ao Metrópoles que o tio do sobrevivente entrou em contato via mensagem e se referiu ao seu filho como um herói.

“Ele [Matheus] foi um herói, eu tenho esses dizeres escritos para mim, então isso me conforta, isso me dá forças para continuar”.

A advogada também disse que não sabe o motivo exato da queda, mas que pelo o que foi ensinada pelo filho, acredita em uma série de fatores, incluindo o cansaço, uma eventual falha mecânica e tempo de reação curto.

Ela mencionou que ainda aguarda o contato das autoridades investigativas. A época dos fatos, o Cenipa afirmou que a conclusão da investigação ocorrerá no “menor prazo possível”, dependendo sempre da complexidade da ocorrência e, ainda, da necessidade de descobrir os possíveis fatores contribuintes. Quando concluído, o relatório final será publicado no site do Cenipa. Até o momento não há nada publicado.

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