Transição para reforma tributária não será feita “sem dor”, diz Appy

A transição do complexo sistema tributário atual do Brasil para o novo modelo instituído pela reforma tributária, cuja regulamentação foi sancionada no início deste ano, não será feita “totalmente sem dor” e vai exigir esforço das empresas para que se adaptem. A avaliação é do secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, que defendeu a nova legislação e destacou seus potenciais benefícios para a economia brasileira.

Appy participou nesta manhã de um seminário promovido pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) sobre a reforma tributária, na sede da entidade, na capital paulista. O evento também contou com a presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB).

O secretário da Reforma Tributária participou de uma mesa de debates ao lado do vice-presidente do Conselho Jurídico da Fiesp, Heleno Torres, e do economista-chefe da entidade, Igor Rocha, que foi o moderador do painel.

Apesar de elencar o que entende como avanços proporcionados pela reforma tributária, Bernard Appy reconheceu que o período de transição “não será fácil”.

“Vai ter alguma dor na saída. Teremos que sair da zona de conforto, porque as empresas se adequam às distorções do sistema atual. As distorções vão acabar e isso vai afetar as empresas. Elas terão de sair da zona de conforto para se adequar ao modelo da reforma tributária, mas, no longo prazo, será muito melhor para elas. Não será totalmente sem dor. Será um mundo diferente daquele que temos hoje”, afirmou Appy.

Segundo o secretário extraordinário da Reforma Tributária, “vai mudar muita coisa no modelo de negócio das empresas, que têm de entender como essas mudanças vão ocorrer”.

“O custo dos insumos vai mudar, a recuperação de crédito vai mudar, o benefício fiscal com transição vai deixar de existir… e tudo isso afeta o modelo de negócios das empresas. Tem uma transição, que vai exigir uma adequação ao novo sistema tributário”, alertou.

“O sistema de apuração do novo tributo é totalmente novo porque, na prática, não dá para aproveitar nada do que existia. O que dá para aproveitar são os documentos fiscais eletrônicos, área em que o Brasil está muito avançado”, prosseguiu Appy.

“A parte operacional é um grande desafio. É óbvio que haverá bom senso. As empresas terão um tempo para se ajustarem ao novo modelo. Mas o fato de a legislação ser muito mais simples que a atual ajuda para que as empresas se adequem”, disse o secretário.

Crítica às exceções

Durante sua participação no seminário da Fiesp, Bernard Appy fez coro ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que havia falado mais cedo, e criticou as exceções aprovadas para setores que reivindicaram alíquotas menores, o que terá como consequência a elevação da alíquota média.

“Em função das várias exceções aprovadas no Congresso, a reforma vai reduzir muito a complexidade [do sistema tributário], mas não vai reduzir tudo o que poderia”, lamentou Appy.

“Em uma reforma ideal, em que não tivéssemos nenhuma exceção, que resultaria naquela alíquota de 21% ou 22%, nós reduziríamos enormemente a complexidade. Mas, mesmo assim, é um efeito muito importante”, explicou.

“Temos no Brasil um sistema extremamente complexo que prejudica o crescimento. É o sistema de tributos mais complexo do mundo. Complexidade gera custos para as empresas e também muitas possibilidades de interpretação, causando litígios e insegurança jurídica, o que prejudica o investimento”, continuou o secretário.

“Por uma série de falhas em nosso sistema, ele acaba onerando investimento e tirando a competitividade da produção brasileira ao onerar exportações. Isso tem um efeito bastante negativo sobre o crescimento.”

Indústria será beneficiada

Em sua fala, Bernard Appy destacou a importância da reforma tributária para o setor industrial do país, o que mais tem sofrido com o modelo atual.

“A indústria vai se beneficiar claramente por causa da não cumulatividade plena [ou seja, os tributos pagos ao longo da cadeia gerarão créditos imediatos]. O setor vai conseguir recuperar integralmente o crédito de tudo o que é utilizado em sua cadeia de produção, principalmente do seu investimento”, projetou Appy.

“A desoneração do investimento, que faz parte da não cumulatividade, é um dos fatores que mais vai beneficiar a indústria do país”, prosseguiu.

“A indústria também vai se beneficiar pelo ganho de competitividade. Certamente, depois da reforma tributária, o percentual de exportação da produção industrial brasileira tende a crescer. Vai ganhar competitividade na venda para o exterior em relação ao sistema atual. O efeito final é claramente positivo”, concluiu.

Relembre

A promulgação da Emenda Constitucional 132, em dezembro de 2023, estabeleceu as bases de uma longa transição para reunir impostos sobre o consumo de estados e municípios, acabar com a guerra fiscal e dar mais transparência aos tributos pagos.

A emenda é oriunda da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, que tem como principal efeito a unificação, a partir de 2033, de cinco tributos — ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins — em uma cobrança única, que será dividida entre os níveis federal (CBS: Contribuição sobre Bens e Serviços) e estadual/municipal (IBS: Imposto sobre Bens e Serviços).

A CBS e o IBS serão tributos do tipo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que acaba com o “efeito cascata” – capaz de levar um mesmo imposto a ser pago várias vezes durante o processo de produção ou de comercialização do mesmo bem. A estimativa do governo federal é que a alíquota de referência do IVA fique em 28,5%, acima da alíquota média, de cerca de 22% (menor por causa das exceções).

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