Moody’s alerta sobre quadro fiscal dos EUA: “Declínio de vários anos”

A Moody’s, uma das três principais agências de classificação de risco do mundo, fez um alerta sobre a preocupante situação fiscal dos Estados Unidos e manifestou apreensão em relação à política tarifária imposta pelo governo do presidente norte-americano Donald Trump.

Em relatório publicado na última terça-feira (25/3), a Moody’s afirmou que o “tarifaço” de Trump pode afetar a capacidade do país de lidar com uma dívida que vem crescendo cada vez mais e com taxas de juros em níveis mais elevados.

Segundo a agência de risco, a “força fiscal da América está no caminho de um declínio contínuo de vários anos”. Para a Moody’s, o quadro fiscal da maior economia do mundo já se deteriorou “ainda mais” desde que a agência atribuiu perspectiva negativa à classificação de crédito triplo A de alto nível dos EUA, em novembro de 2023.

“O potencial impacto negativo de tarifas altas sustentadas, cortes de impostos sem financiamento e riscos significativos para a economia reduziram as perspectivas de que essas forças formidáveis continuem a compensar déficits fiscais crescentes e a queda na acessibilidade da dívida”, diz a Moody’s.

Apesar de ter apontado a “resiliência econômica extraordinária” da economia dos EUA, a agência afirmou que “o enfraquecimento fiscal, provavelmente, persistirá mesmo em cenários econômicos e financeiros muito favoráveis”.

A Moody’s observou ainda que a “acessibilidade da dívida dos EUA permanece materialmente mais fraca do que a de outros soberanos com classificação triplo A e altamente avaliados”.

A agência avaliou também que, mesmo com cenários econômicos eventualmente mais positivos, haverá “riscos crescentes de que a deterioração na força fiscal dos EUA não seja mais totalmente compensada por sua extraordinária força econômica”.

Entre os critérios avaliados pelas agências de risco para aumentar ou diminuir a nota de crédito de países ou empresas, estão indicadores macroeconômicos, como taxa de juros, inflação, câmbio e o Produto Interno Bruto (PIB). Também são considerados o ambiente político, o grau de estabilidade institucional e as projeções para a economia.

Tarifas seguem no radar do mercado

Os mercados continuam acompanhando as repercussões e impactos da dura política tarifária dos EUA. Nos últimos dias, os investidores têm consolidado uma percepção de que as chamadas tarifas comerciais “recíprocas” anunciadas por Trump devem se concentrar em um número limitado de países – provavelmente, Canadá, México, Japão e União Europeia (UE).

Entretanto, o clima de incerteza em relação a uma possível guerra comercial permanece. Trump já disse que um novo pacote de tarifas deve ser anunciado no dia 2 de abril, possivelmente para todos os parceiros comerciais dos EUA. Há rumores de que mercados com os quais os EUA têm superávits comerciais e comércio reduzido, como nações africanas, podem ser poupados.

Na última segunda-feira (24/3), o presidente dos EUA afirmou que anunciaria “nos próximos dias” tarifas direcionadas ao setor de automóveis e outros produtos.

Na última reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA), na semana passada, a segunda do colegiado desde a posse de Trump, as expectativas do mercado foram confirmadas e a taxa básica de juros se manteve inalterada, no intervalo de 4,25% a 4,5% ao ano.

A reunião foi a segunda consecutiva na qual a autoridade monetária norte-americana manteve inalterada a taxa de juros. Antes das duas últimas reuniões, o Fed tinha promovido um ciclo de três quedas consecutivas dos juros nos EUA, que começou em setembro do ano passado – o primeiro corte em cinco anos.

Desde então, o BC norte-americano sempre deixou claro que era necessário manter a cautela e analisar cuidadosamente os indicadores econômicos para tomar suas decisões de política monetária.

O Fed indicou ainda que deve reduzir em 0,5 ponto percentual os juros básicos até o fim deste ano, em um cenário de desaceleração da economia do país e, eventualmente, de queda da inflação. De acordo com as projeções apresentadas pelo Fed, a queda dos juros ocorreria em duas reuniões, com redução de 0,25 ponto percentual em cada uma delas.

A elevação da taxa de juros é o principal instrumento dos bancos centrais para conter a inflação.

Recessão a caminho?

Entre o início do governo Trump, em 20 de janeiro, e o dia 14 de março de 2025, empresas norte-americanas listadas nos principais índices das bolsas de valores do país perderam cerca de US$ 4 trilhões em valor de mercado.

Neste ano, o Dow Jones acumula desvalorização de 2,5%, o S&P 500 caiu 4,1% e Nasdaq desabou 8,1% (a maior queda entre 21 indicadores globais). O chamado “índice do medo” (Volatility Index”, o VIX, na sigla em inglês), usado como referência sobre o nível de volatilidade do mercado, atingiu em março o nível mais alto de 2025.

Em meio ao clima de incerteza, amplificado pelos rompantes de Trump e por uma dura política tarifária que colocou o mundo à beira de uma guerra comercial, a hipótese de os EUA entrarem em recessão foi reforçada pelo GPDNow – uma espécie de “monitor do PIB” elaborado pelo Federal Reserve de Atlanta. Em sua última leitura, no início de março, a estimativa era a de uma queda anualizada de 2,5% do PIB no primeiro trimestre, bem diferente da projeção anterior (alta de 2,3% para o período).

De acordo com um relatório elaborado por analistas do JPMorgan, a economia dos EUA deve avançar apenas 1% entre janeiro e março (ante 1,5% da estimativa anterior do banco) e a probabilidade de recessão nos próximos 12 meses chega a 40%. O Goldman Sachs, mais moderado, fala em 20%. A consultoria BCA Research, mais pessimista, indica uma chance de 75% de que o país entre em recessão técnica nos próximos três meses.

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