Como Poupatempo descobriu que juiz Edward na verdade era José Eduardo

São Paulo O Ministério Público de São Paulo apresentou uma denúncia contra um juiz aposentado por uso de documento falso e falsidade ideológica. Segundo a investigação, o magistrado Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield era, na verdade, José Eduardo Franco dos Reis, e enganou instituições públicas por 45 anos.

A denúncia, oferecida à Justiça em 27 de fevereiro de 2025, dá detalhes sobre como a farsa foi descoberta.

O documento conta que, no dia 3 de outubro de 2024, José Eduardo compareceu ao Poupatempo Sé para solicitar a segunda via do RG, afirmando ser Edward Albert. Na ocasião, ele apresentou uma certidão de nascimento falsificada com o nome de origem inglesa.

O Poupatempo colheu, então, as impressões digitais do suposto Edward para fazer a nova via do RG. Quando as digitais entraram nos sistemas de identificação automatizados, no entanto, os sistemas apontaram que elas pertenciam, na verdade, a um homem chamado José Eduardo Franco dos Reis.

Por causa das inconsistências, a Polícia Civil abriu uma investigação contra o suspeito, que terminou comprovando uma duplicidade de registros. José Eduardo tinha conseguido não apenas fazer um documento de identidade em nome de Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield, como também tinha título de eleitor, CPF e passaporte com a identidade falsa.

A denúncia afirma ainda que José usou o passaporte com nome inglês para deixar o país, depois de que a fraude foi descoberta.

O acusado utilizava identidade falsa pelo menos desde 1980, segundo a investigação. Em 19 de setembro daquele ano, o paulista foi ao Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt (IIRGD) e afirmou ser filho de Richard Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield e de Anne Marie Dubois Vicent Wickfield para conseguir uma identidade.

Na época, ele apresentou cópias falsas de um certificado de dispensa do Exército, uma carteira de servidor do Ministério Público do Trabalho e uma carteira de trabalho, além de um título de eleitor com o nome de Edward, para conseguir a identidade.

“Tais documentos, à época, não contavam com quaisquer dispositivos gráficos ou materiais de segurança, sendo facilmente falsificáveis. De outra banda, até a adoção dos sistemas eletrônicos, excetuadas pesquisas em investigações criminais, não havia condições de comparação de impressões dígito-papilares colhidas quando da identificação civil, razão pela qual não foi possível identificar que se tratava da mesma pessoa”, diz a denúncia.

Com a identidade falsa, José se matriculou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e em 1995 passou em um concurso para juiz. Em entrevista sobre a aprovação para o cargo naquela ocasião, ele afirmou ser descendente de nobres britânicos. Seu avô teria sido um juiz no Reino Unido.

O acusado também conseguiu tirar habilitação e comprou um carro com a identidade falsa. A investigação cita que ele manteve a identidade verdadeira em uso e chegou a pegar segunda via do RG verdadeiro em 1993. Naquela época, o sistema do IIRGD não estava “aparelhado para identificar a fraude”, segundo o MPSP.

Com o sistema automatizado de agora, no entanto, foi possível descobrir a mentira.

“[José] Somente foi descoberto porquanto não imaginava, por incrível que isso possa parecer a um magistrado aposentado, que os sistemas de identificação não iriam confrontar as impressões dígito-papilares”, disse o promotor Maurício Salvadori na peça.

O juiz aposentado, hoje com 67 anos, tem vencimentos brutos no valor de R$ 166 mil – o valor considera gratificações e outras vantagens.

A denúncia do MPSP não aponta as razões pelas quais José usou a identidade falsa. Como mostrou o Metrópoles, o nome falso, usado por ele tem referências na literatura inglesa.

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