Como a dívida dos estados virou moeda de troca em Brasília

São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Goiás são os estados com mais débitos com a União. No total a dívida de todos os estados e do Distrito Federal é estimada em R$ 764,9 bilhões. 

O presidente do Senado Rodrigo Pacheco propõe um novo projeto para resolver a questão. O “Programa de Pleno Pagamento da Dívida”  reúne dois eixos principais: a possibilidade de os estados usarem seus ativos para o abatimento da dívida e mudanças no indexador que corrige essa dívida. “O projeto é um ponto inicial, não tem a audácia de ser um texto definitivo. Naturalmente o Ministério da Fazenda e o governo federal farão suas ponderações, porque nem tudo que sugeriram está inserido [no projeto]. Governadores também vão debater. É um texto com o mínimo de consenso, preservando os interesses dos endividados, da Fazenda Pública, exigindo contrapartidas e garantindo que o proveito do pagamento da dívida se dê em todos os estado”, disse Pacheco em entrevista coletiva. 

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, em entrevista coletiva (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

A proposta prevê permissão para que as dívidas sejam renegociadas em até 30 anos. Em relação às mudanças no indexador, o presidente do Senado lembrou que hoje é usado o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) mais 4% ao ano. Ele explicou que, após as negociações com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ficou acertado que parte desses 4% devem ser revertidos para investimentos no próprio estado.  

Renegociação de dívidas gera ativos políticos

Para o analista político Bernardo Livramento, da Fatto Inteligência Política, a dívida dos estados virou moeda de troca em Brasília. “É uma questão bastante focalizada na política mineira. A demanda surge muito por uma situação ruim fiscal do estado de Minas Gerais, uma incapacidade do governo de responder a isso”, opina ele. Bernardo lembra que o governo mineiro não conseguiu fazer grandes privatizações, o que abateria o valor importante de dívida e também não conseguiu criar regimes de recuperação fiscal que garantam uma sustentabilidade dos resultados primários do estado. “ por ser presidente do Senado, ser mineiro e ter ambição de estar num cargo executivo de Minas Gerais ou ser reeleger senador, Rodrigo Pacheco abre os olhos pra isso”, argumenta o analista. 

Do lado do governo federal a questão também se torna um ativo político. “Pelo fato do presidente Pacheco ser de um partido que vem tentando construir algumas alianças com o PT em Minas Gerais e também por ele ser o presidente do Senado e isso fazer com que ele tenha muito poder de agenda ali no Senado Federal. Então, se o governo federal ajudar Pacheco com essa questão que impacta de forma bastante ali em Minas Gerais, o Rodrigo Pacheco também tem simpatia em relação a não pautar algumas coisas de interesse do governo”, lembra Bernardo. 

Na visão do analista, o PT tem pouca entrada na eleição estadual. Tanto que em 2022 o candidato ao governo do estado de Minas apoiado pelo Lula foi o Alexandre Calil do próprio PSD do Pacheco.,”Essas alianças com o PSD e o PT já vem se construindo ali há algum tempo. Dentro disso, o PT, mais que o PT, o Lula especificamente, ele tem claro para ele que é muito difícil um candidato próprio do partido vencer em 2026 e é um estado importantíssimo porque é um estado único do sudeste, muito populoso e o único do sudeste é onde o Lula venceu em 2022, então ele olha com carinho para o candidato ao governador de Minas porque ele sabe que vai ser um cabo importante para ele”, analisa. 

Outro analista político, Miguel Daud, afirma que a renegociação dos débitos estaduais pode oferecer vantagens estratégicas para o presidente Lula. “é um político muito hábil. Quando se vê ameaçado, ele tem argumentos. Agora está atacando o Banco Central, ele joga o pobre contra o rico,” comenta Daud. Esse movimento pode ser visto como uma forma de Lula garantir apoio político crucial em Minas Gerais, especialmente se ele apoiar a candidatura de Pacheco ao governo do estado. Daud enfatiza que, no contexto atual, as preocupações dos políticos vão além dos benefícios diretos para o Brasil. “Os políticos hoje não estão preocupados se esse projeto é bom para o Brasil; o que mais os preocupa é sua posição política e a do seu partido,” observa.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.