O meio ambiente entrou pelo cano (por Gustavo Krause)

O Presidente dos EUA cumpre não somente as promessas de campanha. Vai além. E usa o método “inundando a área” com centenas de decretos (ordens executivas e similares) que ocupam os espaços midiáticos e inquietam as pessoas. Ao Presidente importa mais “causar” e tensionar a conjuntura internacional a adotar decisões eficazes.

Na questão ambiental, o negacionismo se manifestou na imediata retirada dos EUA do Acordo de Paris, na ratificação de força dos combustíveis fósseis e na ordem, aparentemente ridícula, de incentivar o governo americano e os consumidores a comprarem canudos de plásticos. A medida está alinhada com a política de incentivos à indústria de petróleo da qual o “canudinho” é um produto derivado.

Evidências revelam que milhões de toneladas de plásticos descartáveis poluem o meio ambiente, os oceanos, intoxicam a cadeia alimentar e o processo de decomposição leva séculos para eliminar o poluente. No plano global, agrava a ocorrência de eventos que oscilam entre o calor extremo, frio intenso, secas, enchentes e incêndios devastadoras. Ou seja, a expressão “emergência climática” não é fruto do alarmismo ativista. É a constatação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima – IPCC segundo a qual a temperatura média global do planeta em 2024 ultrapassou pela primeira vez a marca de 1,5º C, comparado aos níveis pré-industriais, ao longo de 11 meses. O futuro chegou arrombando as nossas portas e ameaçando nossas vidas.

Se o Presidente dos EUA respeitasse alguns dos seus antepassados a exemplo da obra do notável anarcoambientalista Henry David Thoreau (1817-1862), escutaria as vozes de Gifford Pinchot (1865-1946) figura central do conservacionismo, movimento político e ambiental em defesa da proteção da natureza; e de John Muir (1838-1914) que atribuía um valor intrínseco à natureza, tornando-se, assim, fundador do preservacionismo.

De fato, ambos influenciaram a agenda governamental ao incluir um olhar de respeito à natureza na esteira dos impactos do modo de produção capitalista. Em 1872, o Presidente Ulysses Grant (1822-1885) criou o primeiro parque nacional no Estados Unidos e, no mundo, o Yellowstone. Na linhagem naturalista e conservacionista cabe destacar, também, o Presidente Theodore Roosevelt (1858-1919) que assumiu o mandato (1901-1909) em decorrência do assassinato do Presidente eleito William McKinley (1843-1901)

No século atual, o Vice-Presidente Al Gore, em 2000, derrotado por George Bush, em polêmica eleição, ganhou destaque internacional como pensador e ativista da causa ambiental, com o documentário “Uma Verdade Inconveniente”, premiado com o Oscar em 2007 e, junto com Painel Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas da ONU, com foco no aquecimento global, recebeu o Nobel da Paz.

Com Trump, o significado do Parque Nacional de Yellowstone, o exemplo de Al Gore e os compromissos formalmente assumidos nas diversas conferências internacionais sobre sustentabilidade entraram pelo cano, um cano de plástico, reconhecidamente, uma praga ambiental.

Para os negacionistas, de nada vale a recorrência severa dos desastres ambientais. Zero de compromisso ético com gerações vindouras. Neste ponto, O Brasil, apesar de lamentáveis retrocessos, segue, diante do mundo, como uma potência ambiental de valor estratégico.

Devido à referência a um tipo consagrado pelo Sistema de Unidades de Conservação (SNUC – Lei 9985/2000), o Parque Nacional, cabe ressaltar que o Brasil acolhe e protege a maior biodiversidade do mundo em 75 áreas com base na relevância ecológica, na beleza cênica em paisagens deslumbrantes, criadas por leis e administradas pelo Instituto Chico Mendes – ICMBio, por iniciativa da respeitável da Ministra Marina Silva (Lei 11.512/07).

Na minha passagem pelo Ministério (1995-1998), tive a oportunidade, de ver e viver o encantamento de vários deles e, graças a uma equipe multidisciplinar, competente e comprometida com uma relação amorável com Natureza e respeitosa com a Humanidade, foi possível deixar uma belíssima edição com 36 áreas (Parque Nacionais: SP: Empresas das Artes, 1998), descritiva e fotográfica que encanta e emociona.

Difícil não foi tomar a decisão de realizar o trabalho, mas cumprir com a tarefa que me foi dada pela equipe de escrever a apresentação da obra maravilhosa.

“PARQUES NACIONAIS: FRAGMENTOS DA VIDA

Cartola que me perdoe, mas as rosas falam

Falam do encontro

Da chegada

Da paixão

Falam do desencontro

Da partida

Da saudade

Da beleza

Do desespero

Do amor

Falam e… exalam

 

A Natureza é assim. Fala, exala e ensina.

Ensina que tudo deve estar em ordem

Ordem orgânica

Simétrica

Harmônica

 

Ensina que a vida é uma totalidade

Ordem inteira

Articulada

Rítmica

 

Ensina que tudo funciona em equilíbrio permanente

Ordem rompida

Restaurada

(Re)Unida

Em caminhada

 

Os Parques Nacionais são assim. Fragmentos da totalidade da vida

Fruto da vontade humana

Sob a proteção da lei

Oferta

 

Uns são recatados

Outros, voluptuosos

Alguns, horizontais

Outros, sinuosos.

Todos místicos

Uma lindeza

Úteis

Úteros

 

Neles, estão inscritos raios de sol

Rastros de lua

Jornada dos ventos

A inocência dos bichos

Neles, o tempo faz morada

Em séculos de construção

Ou em minutos de destruição

Sempre, o desafio da conservação”,

 

Gustavo Krause foi ministro da Fazenda 

Adicionar aos favoritos o Link permanente.