Marco temporal: Gilmar Mendes retira mineração em terras indígenas de conciliação no STF

Nesta quinta-feira (27), durante a retomada dos trabalhos da Comissão do Marco Temporal no Supremo Tribunal Federal (STF), o representante do gabinete do ministro Gilmar Mendes, o juiz auxiliar Diego Veras, informou que Mendes determinou a exclusão do tema mineração em terras indígenas dos debates da comissão. O grupo iniciou os trabalhos em agosto de 2024, sob protesto dos movimentos indígenas e organizações da sociedade civil. A conciliação foi suspensa por 30 dias, a pedido da Advocacia-Geral da União (AGU), que solicitou mais tempo para avaliar os termos propostos até então.

A mineração em terras indígenas foi uma das partes mais polêmicas da proposta apresentada em fevereiro deste ano pelo ministro. Indígenas convivem com impactos negativos causados pelo garimpo e a mineração em seus territórios, como contaminação de rios, desmatamento e aumento de violência.

A Organização das Nações Unidas (ONU) chegou a se manifestar pedindo que a câmara de conciliação suspendesse a proposta de mineração. “Expressamos nossa profunda preocupação com a proposta […], que contradiz diretamente a Constituição do Brasil, as decisões do próprio Supremo Tribunal Federal e o direito internacional dos direitos humanos”, registrou o comunicado assinado por três relatores especiais da organização: sobre o Direito Humano a um Meio Ambiente Limpo, Saudável e Sustentável, sobre Mudanças Climáticas e sobre Tóxicos e Direitos Humanos.

A tese do “marco temporal” já havia sido declarada inconstitucional pelo plenário do próprio STF em setembro de 2023. Em um levantamento feito pelo Instituto Socioambiental (ISA), ao menos 397 terras indígenas estariam ameaçadas pela tese, que preconiza que os povos indígenas teriam direito apenas às áreas que ocupavam ou já disputavam na data de promulgação da Constituição de 1988.

Foi uma decisão do próprio ministro Gilmar Mendes instalar a “comissão especial” de “conciliação”. Além dos indígenas, integram a comissão parlamentares e entidades ruralistas e políticos bolsonaristas. O tema já foi tratado diversas vezes pelo jornalista colunista da Agência Pública Rubens Valente. Em fevereiro, noticiamos que a proposta de Mendes recuperava trechos inteiros do Projeto de Lei (PL) 191, abandonado pelo governo Lula (PT) em 2023.

Episódio de “Pública Explica” aborda a tese do marco temporal e seus impactos nos direitos indígenas

Mudança sob pressão

Mendes decidiu na sessão desta quinta-feira que a discussão sobre a exploração mineral deverá ocorrer fora da minuta proposta e que o tema deverá ser debatido em uma comissão específica no STF. 

A AGU também apresentou uma proposta de minuta relacionada ao tema, sugerindo que o presidente Lula edite um decreto com as alterações para evitar mudanças constantes na legislação e garantir a efetividade da implementação da norma. No documento, não há previsão de mineração em terras indígenas.

Ao longo das negociações, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) retirou-se do processo por considerar a composição do colegiado desfavorável e prejudicial aos direitos indígenas. 

Segundo afirmou Maurício Terena, consultor jurídico da Apib, a minuta prejudica direitos adquiridos e contradiz o entendimento da própria Corte. “Protocolamos vários recursos judiciais, inclusive para coibir a mineração, e todos foram ignorados”, disse.

Laura Rico, diretora de campanhas da Avaaz, organização sem fins lucrativos de ativismo global, enfatizou à Pública a importância da proteção dos territórios indígenas em um contexto global, especialmente com a realização da Conferência do Clima da ONU (COP30) no Brasil, em novembro. Ela ressalta: “Com a COP30 acontecendo no Brasil, temos a responsabilidade de mostrar compromisso com a preservação ambiental e os direitos dos povos originários”. 

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